Proust aos 16 anos
"(assim o nosso coração muda, na vida, e é a pior dor; mas nós só a conhecemos na leitura, em imaginação: na realidade ele muda, como se produzem certos fenómenos da natureza, assaz lentamente para que, se podemos constatar sucessivamente cada um dos seus estados diferentes, em contrapartida, a sensação mesma da mudança nos seja poupada.)"
"Du côté de chez Swann" (Marcel Proust)
E, no entanto, antes do romance psicológico, antes da própria literatura, a mudança dos sentimentos, que não é nada comparada com a do corpo, operada insensivelmente a todo o tempo, era uma experiência dos homens que, por assim dizer, a não conheciam, como se podia desconhecer a própria morte se não a víssemos nos outros.
A literatura é então um ecrã para captar o ser do tempo e dele fazer um objecto do pensamento.
Pergunto-me se não estaremos a construir um mundo em que esse objecto esteja tacticamente ausente.
É que ele só interessa ao sujeito ocidental, tal como o conhecemos, há relativamente pouco tempo e apenas numa pequena parte do planeta.
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