domingo, 28 de fevereiro de 2010


Arouca (José Ames)

O PODER SEDUTOR




"Se for preciso, reconhecê-lo-ei para te dar prazer; porque devo confessar que o mérito do fundo escapou à minha incapacidade. Só prestei atenção à arte oratória; quanto ao fundo, penso que nem o próprio Lísias se terá sentido satisfeito. Creio ter-me apercebido, Fedro – talvez sejas da minha opinião – que ele disse duas ou três vezes a mesma coisa, quer porque não tivesse recursos suficientes para achar muito que dizer sobre o assunto, quer porque, talvez, não se preocupasse com isso; deu-me a ideia duma bravata juvenil e que para ostentar o seu talento exprimia os seus sentimentos duma maneira, depois de outra. E de cada vez com igual maestria."

"Phèdre" (Platão)


Todos podemos evocar alguém que no parlamento, ou em qualquer outro lugar público, esquece o fundo duma questão para nos tentar ofuscar com o brilho da forma.

As sentenças lapidares de alguns comentadores da televisão, a sua arte de "desossar" os mais complexos assuntos, reduzindo-os a uma fácil escolha entre a perna ou a asa, é, de facto, admirável.

Claro que isso não merece o feio nome de manipulação, porque talvez seja melhor definido como arte de sedução. De seducere (*), "levar a água ao seu moinho" foi sempre o objectivo da retórica na vida política. E essa arte deve ser julgada, não por tentar influenciar os espíritos, mas pela qualidade do fim que tem em vista.

Mas quando Cícero, em vez de subir à tribuna para se dirigir aos seus pares, fala dum outro tipo de tribuna que conta à partida com a passividade duma audiência, incomparavelmente maior do que qualquer senado, então a forma é capaz de ser quase tudo e o poder a principal motivação.

É que o telespectador, enquanto tal, é um "avatar" do cidadão perdido no mundo privado.


(*) "Seducere es un antiguo verbo romano que quiere decir llevar a un lugar apartado. Atraer hacia sí fuera del mundo. Ser dux aparte. El reino de otro mundo. Seducir es lo contrario de desposar. En romano casarse se dice ducere, llevar. Ducere uxorem domun, llevar a la esposa a su casa. Por el contrario, se–ducere es separar a una mujer del domus, es llevarla a un lugar apartado, en la separación, en el secreto, en el secretus, primero "fuera de sí", luego "lejos de los demás hombres". (Vida secreta- Pascal Quignard)

In http://glup2.blogspot.com/2008/12/seducere.html


sábado, 27 de fevereiro de 2010


(José Ames)

UM SISTEMA SENSÍVEL


http://www.coded.be/files/u1


"Se bem que o termo de democracia esteja em todos os lábios, faz-nos falta ainda uma concepção suficientemente precisa deste tipo de codificação da política. Como para todas as codificações, trata-se aí de distinguir entre um valor positivo 'governo' e um valor negativo 'oposição'. Se bem que um valor se reflicta no outro e uma contínua relação de inversão se estabeleça entre os dois, a estrutura permanece, apesar disso, assimétrica – o que quer dizer que é ao mesmo tempo simétrica e assimétrica. (…) Em tudo o que o governo empreende, a oposição está efectivamente co-presente, do mesmo modo que a oposição constantemente se orienta em função do governo – de facto, sobre que outra base poderia ela orientar-se?"

"Politique et Complexité" (Niklas Luhmann)


Esta definição aplica-se com mais propriedade ao bipartidarismo, porque onde há partidos na oposição "absoluta" (sem esperança de virem a governar), é de crer que se orientarão menos pelos actos do governo do que por uma semântica própria, no limiar da política.

Luhmann diz que esta cisão do sistema político no seu topo constitui "um resultado evolucional altamente improvável", correspondendo a um código diferente do que prevaleceu nas teorias do Estado na segunda metade do século dezoito. E é este adquirido estrutural que, em termos de adaptação, explica a superioridade da democracia.

A alternância entre os partidos no poder, a inversão entre o governo e a oposição, de facto, fragiliza o sistema em termos de poder. Mas é essa, paradoxalmente, a vantagem deste regime, que lhe permite dotar-se duma "nova sensibilidade" em relação a um meio ambiente mais complexo. O sistema político, com isso, em vez de se colocar acima da sociedade, torna-se um dos seus numerosos sub-sistemas. Um sistema autónomo que "tem de se codificar e programar em função da contingência."


sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010


Arraiolos (José Ames)

ASTÚCIA HEGELIANA



"Embora daqui resulte uma dialéctica da razão, uma vez que, pelo que respeita à vontade, a liberdade que a esta se atribui parece estar em contradição com a necessidade natural, e nesta encruzilhada a razão, sob o ponto de vista especulativo, acha o caminho da necessidade natural muito mais plano e praticável do que o da liberdade, no entanto, sob o ponto de vista prático, o caminho de pé posto da liberdade é o único por que é possível fazer uso da razão nas nossas acções e omissões; pelo que será impossível à mais subtil filosofia como à razão humana mais vulgar eliminar a liberdade com argumentos sofísticos."

"Fundamentação da Metafísica dos Costumes" (Emmanuel Kant)


Isto é, se formos dados à contemplação, a questão da liberdade não se coloca, visto que deixamos que a necessidade natural ou a causalidade social façam o seu caminho, realmente, no "melhor dos mundos possíveis". É quando agimos (ou deixamos de agir) que se impõe a ideia da liberdade.

Mas Kant diz que esse "é o único caminho por que é possível fazer uso da razão". Se não pressupusermos a liberdade, o uso da razão será simplesmente impossível. Daqui segue-se que a própria existência da razão não se poderia explicar se não fôssemos livres.

… Ou que é sempre possível o uso da razão como logro. O que é de certa forma sugerido pela expressão hegeliana de "astúcia da razão".

quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010


(José Ames)

BASTIDORES


O Grande Canal (
John Haskins)


"(Ruskin, referindo-se à catedral de S. Marcos) Então vêm os ornamentos interpolados da frente e dos lados; depois as folhagens decorativas dos arcos superiores, extravagâncias da incipiente Renascença: e, finalmente, as figuras que carregam as goteiras do lado norte – inteiramente o bárbaro trabalho dos séculos dezassete e dezoito – ligam o conjunto com o emplastro dos restauros de 1844 e 1845. A maior parte dos palácios de Veneza dificilmente suportaram interpolações menos numerosas; e as do Palácio Ducal são tão intrincadas que um ano de trabalho seria provavelmente de todo insuficiente para as desemaranhar e definir."

"The stones of Venice" (John Ruskin)


O olhar do turista contenta-se com muito pouco. Importa-lhe mais que a história das pedras pareça bem contada do que seja verdadeira. É assim que o melómano intuitivo escuta um trecho atribuído a um grande nome. Conhecer a técnica musical e as "interpolações" a que as várias interpretações submeteram a obra é sem dúvida um prazer, mas de outra ordem e que não lhe parece essencial para o juízo do gosto.

Veneza corre o risco, cada vez mais, de se tornar um museu. Guido Piovene ("Viaggio in Italia") diz sobre o Grande Canal: "(…) o tráfico é terrestre, o maior fluxo pedonal segue o curso do Grande Canal pelo interior, formando uma espécie de anel. O Canal fica de fora, quase segregado, transformando-se numa fila de belos bastidores erguidos sobre coisa nenhuma."

A cidade, contra a sua lenda, tornou-se sobretudo terrestre (stradale). Ilusão suprema a acrescentar às outras dos que passam a correr.

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010


Madrid(José Ames)

O ANTÍDOTO DO ÓPIO



Ainda da liberdade. Se a "liberdade interior" é, mais propriamente, o livre-arbítrio, e a liberdade não se compreende inteiramente fora da vida política, isto é, entre os homens e não no diálogo do indivíduo consigo próprio, conforme a análise de Hannah Arendt, é preciso reconhecer, com ela, o sentido dessa expressão no âmbito da revolução cristã.

Ao separar o crente do mundo político e da escravatura real, o cristianismo operou uma espécie de libertação (que o marxismo considerava um ópio, na mesma medida) que era a de Epicteto, escravo, e ao mesmo tempo filósofo e senhor de si próprio.

A relação política, com os homens, foi transferida para Deus ou a Filosofia. O que isto quer dizer é que, pela primeira vez na história, a consciência tinha o poder de recusar o mundo. Isso teve infinitas consequências para o espírito crítico ( que também começa por recusar a aparência), consequências que ainda hoje se fazem sentir, em todos os domínios, nomeadamente contra o espírito religioso. A religião tinha em si, portanto, o seu próprio antídoto.

Mas a confusão da situação moral (a superioridade da consciência) com a realidade ( a "escravatura" real) condena a política, sem apelo nem agravo.

terça-feira, 23 de fevereiro de 2010


(José Ames)

O PASSADO NUNCA MORRE


Faulkner em Paris

"O passado nunca está morto. Ele nem sequer é passado."

William Faulkner

Mas que espécie de influência sobre o nosso presente e sobre a nossa vida é essa? Comte dizia que os mortos governam os vivos. Devemos entendê-lo metaforicamente, porque, de facto, não se trata de governo, nem sequer de gouvernail (leme). É mais o que a continuação deve a um começo que connosco recomeça. Nós e todas as coisas em tempos diferentes, mas os mesmos.

Conhecemos da literatura e do cinema ( e da psicologia, certamente) o tema do "regresso do passado", que é sempre vingativo, como quando o morto não foi enterrado ou não se lhe fez justiça. Mas essa é a anomalia do passado que, então, tem uma existência separada do tempo. Cada um de nós é a prova que o passado é agora e de que somos o nosso próprio passado.

Na mitologia grega, Cronos, a personificação do Tempo, devora os filhos à nascença para, segundo a profecia, não ser por eles destronado, como ele destronou Uranos. Se somos "filhos" do que fomos, o mito traduz bem a situação, porque se podia dizer que "castrámos" o passado e o aprisionámos no Tártaro, e é em vão que "devoramos" o futuro, porque o haveremos de devolver com o emético de Zeus.

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010


Tavira (José Ames)

ARGOS


Argos Panoptes


O que parece estar a passar-se na política caseira é uma psicose jornalístico-partidária da falta de liberdade. Isso porque ela nunca esteve, de qualquer modo que fosse, ameaçada, como o prova a impunidade com que se ofende e calunia quem vier à rede das escutas, mas porque se trata, na verdade, de uma cultura de maus costumes, em que todos estāo implicados ( o que se veria se tivessem sido feitas oportunamente certas escutas ), é ver quem é o maior paladino da liberdade e das "mãos limpas" na política.

Se alguma coisa de bom sair disto, há-de ser, talvez, a imposição dum mínimo de decência na utilização dos dinheiros públicos, graças a uma qualquer "glasnost" de sabor mediterrânico. Esperemos que o regime sobreviva a tanto espalhafato e fingimento dos que querem reformar a vida política sem se reformarem a si próprios.

De qualquer modo, os políticos que agora foram apanhados em esquemas impróprios estão a ser vítimas duma certa injustiça. Porque fizeram o que foi a prática de quase todos antes deles, mas não estavam informados de que a espionagem orwelliana passara a fazer parte dos meios lícitos da justiça e dos métodos não menos lícitos de vender jornais. Ah, se eles soubessem, não cairiam certamente na asneira!

O político deve agora contar com esse Argos de mil olhos e de mil ouvidos. Mesmo quando se sentar à mesa com os amigos...

domingo, 21 de fevereiro de 2010


(José Ames)

WHATEVER WORKS



O último filme de Woody Allen podia ser a ilustração da teoria de Charles Fourier em "O novo mundo amoroso", e a comunidade judaica de Nova Iorque um falanstério da utopia, se não fosse quase uma imagem do contrário disso: a dos turbilhões do acaso.

É difícil imaginar maior recombinação e desordem do que as que a vida de Boris (Larry David) e a dos seus amigos nos oferece. Metáfora da vida moderna, em que a precariedade não se confina ao mundo da economia e do trabalho, mas atinge as estruturas mais básicas do viver em sociedade, ou imagem da incerteza e dos paradoxos que vigoram na microfísica? Boris é um físico quântico reformado...

A consciência do efémero virada contra tudo o que até aqui foram tentativas de salvar uma qualquer permanência neste mundo ou no outro.

sábado, 20 de fevereiro de 2010


Alcácer do Sal (José Ames)

MEDITAÇÃO



"As coisas que fazem um bom Juiz, ou um bom intérprete das Leis são, em primeiro lugar, uma compreensão correcta dessa principal Lei da Natureza chamada Equidade; a qual, não dependendo da leitura do que outros homens escreveram, mas da bondade da Razão natural do próprio homem e da Meditação, se presume exista naqueles que têm mais tempo e mais inclinação para meditar (…)."

"Leviathan" (Thomas Hobbes)


A antiga distinção entre a vida política e a vida filosófica, com o seu ideal contemplativo, parece inspirar esta ideia da Meditação, privilégio duns tantos que, graças à transferência das suas necessidades de sobrevivência para a maioria ou para uma classe sem direitos cívicos, dispõe do lazer do filósofo.

Apesar do esquema grego, que permitiu, no entanto, o disparo do pensamento ocidental, ser demasiado cru para nos agradar, não tem sido outro, desde então, o segredo do nosso desenvolvimento. É claro que o privilégio só numa pequeníssima percentagem é tão socialmente produtivo, sendo na esmagadora maioria dos casos pura ociosidade, senão parasitismo. Há uma divisão do trabalho que permite a alguns "perderem" tempo a resolver as charadas da Física, numa qualquer repartição, ou a escrever, deitados, longos romances no seu casulo de cortiça.

O problema do bom juiz, para voltar a Hobbes, é que os juízes, hoje em dia, se parecem, cada vez mais, com qualquer outra classe profissional, nem lhes faltando o sindicalismo. E a verdade é que, quando todos nos tornamos mais consumidores e menos cidadãos, o tempo não sobra para a meditação.

sexta-feira, 19 de fevereiro de 2010

A VOLÚPIA REVOLUCIONÁRIA


"Dangerous Liaisons" (1988-Stephen Frears)


Baudelaire disse, comentando "Les liaisons dangereuses", romance de Choderlo de Laclos, escrita antes da Revolução Francesa, que a Revolução é feita pelos voluptuosos.

E a ideia é, obviamente, que as sociedades mudam mais pelos costumes, que afectam todos (e implicam novas configurações do pensamento e das crenças), do que pelo esquadro mental duma elite bem intencionada, como foram a burguesia iluminista ou a vanguarda bolchevique. Pelo menos no último caso, não se pode dizer que as condições de vida não tenham mudado drasticamente, o que, segundo a causalidade materialista, deveria ter produzido novos costumes e uma nova mentalidade. Mas o atavismo não foi vencido, como se viu.

É verdade que a história, e em primeiro lugar, a queda do império romano, parece dar razão ao poeta. Os Romanos da decadência já nada tinham a ver com a raça dos Gracos e dos Brutus.


(José Ames)

quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010


Setúbal (José Ames)

UMA GESTA MODERNA


Lenine (Surov)


"Não devemos ter medo dos Comunistas 'aprenderem' com os peritos burgueses, incluindo comerciantes, pequenos capitalistas co-operadores e capitalistas. Devemos aprender com eles da mesma maneira que aprendemos com os peritos militares, embora duma forma diferente. Os resultados do que é 'aprendido' tem de ser testado pela experiência prática: faz as coisas melhor do que os peritos burgueses ao teu lado; experimenta esta e aquela maneira para assegurar uma melhoria na agricultura e na indústria, e para desenvolver o intercâmbio entre elas. Não resmungues pelo preço da 'propina': nenhum preço da propina será demasiado alto se aprendermos alguma coisa."

"The Tax in Kind" (Lenine)


Aprender, aprender, aprender. Mesmo com o diabo, se ele tiver algo a ensinar-nos, alguma especialidade técnica. Mesmo assim, Oulianov coloca a palavra aprender entre comas. É que não se trata, nesta aprendizagem, duma relação de mestre a aluno, mas antes do mítico furto prometeico aos velhos deuses. É esse "fogo sagrado" que forjará o novo sobre as cinzas que sepultarão a burguesia, e o novo Prometeu tem de usar de manha.

Que maravilhosa confiança no futuro da classe eleita e na marcha imperiosa da História! As técnicas que agora se "furtam", com um zelo iluminado, pertencerão um dia , elas também, ao museu da história, "ao lado do fuso e da roca de fiar".

É o manual hegeliano do senhor e do escravo. Pela virtude, trabalhando melhor e aprendendo cada vez mais, o escravo tornar-se-á o senhor do senhor.

E há outro fundo histórico para esta inversão: a dos cristãos que ganharam, sem armas, o império.

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010


(José Ames)

LAVAGEM AO CÉREBRO


"A clockwork orange" (Stanley Kubrick)


"Os anúncios parecem funcionar segundo o princípio muito avançado de que um grãozinho ou um pequeno motivo sonoro acabará gradualmente por emergir duma ruidosa barragem de repetições e por se impor. Os anúncios levam o princípio do ruído ao nível extremo da persuasão. Eles estão exactamente de acordo com as técnicas de lavagem ao cérebro, possivelmente porque repousam o seu princípio fundamental no assalto contra o inconsciente."

"Pour comprendre les média" (Marshall McLuhan)


A expressão "ataque ao inconsciente" diz muito da época e do moralismo profético deste grande mediólogo dos anos sessenta.

Entretanto, o nosso inconsciente, seja ele o que for, revelou-se muito mais complexo e resiliente do que as teorias primitivas, evocadas por McLuhan, supunham. Claro que os destinatários da sua crítica eram reais, porque nunca faltaram "aprendizes de feiticeiro" para qualquer "ataque" que promova as vendas. O objectivo racional, no limite, seria o de harmonizar a produção e o consumo, assim como "a totalidade dos desejos e dos esforços", o que levaria, segundo McLuhan, a que a publicidade se eliminasse a si mesma, por efeito do próprio sucesso.

Tudo leva a crer que esse cenário nunca será possível, não só porque o campo dos desejos é ilimitado, mas porque o comerciante, tal como o observador na teoria de Heisenberg, modifica o seu "objecto".

A "lavagem ao cérebro" não dá conta do que se passa com a publicidade. O cérebro não precisa de ser virado do avesso (como na máquina de lavar) para ser "impregnado" pelo seu meio. E a verdade é que a publicidade é, nas cidades, mais paisagem do que a natureza.

terça-feira, 16 de fevereiro de 2010


S. Pedro do Sul (José Ames)

OS GRILHÕES DA LIBERDADE



"Porque a partir do momento em que reflectimos sobre um acto que empreendemos na convicção de que somos agentes livres, ele parece cair presa de duas espécies de causalidade, dum lado, a causalidade da motivação interna, e do outro a do princípio causal que rege o mundo exterior."

"La crise de la culture" (Hannah Arendt)


E Arendt continua dizendo que Kant salvou a liberdade deste duplo ataque, com a sua razão prática, fazendo desta o centro do livre arbítrio e da vontade o "refúgio da liberdade". Com isto, a ideia da liberdade, que era na Grécia antiga um exclusivo da vida política, tornou-se, de facto, mais confusa.

Podemos pensar num caso extremo da "liberdade interior" (a do prisioneiro político que se mantém fiel ao seu ideal), para nos apercebermos dessa confusão. Em primeiro lugar, essa liberdade é apenas uma liberdade de pensar (não envolve qualquer possibilidade de acção), e depois depende tanto do regime da prisão como da resistência do próprio corpo, em qualquer caso, duma causalidade bem constringente. Mas esta pode ser a situação de qualquer homem, face aos perigos da existência. Ou seja, se a ideia da liberdade tem um sentido, não é ao nível do indivíduo, a sós consigo mesmo, mas no espaço em que interage com outros indivíduos, o espaço público. A liberdade de acção é aqui fundamental. Ela é "(…) realmente a condição que faz com que os homens vivam juntos numa organização política." (ibidem)

Como é muito verdade que a vida política depende do "princípio causal que rege o mundo exterior", a liberdade de acção que dá o sentido à política está ela própria submetida a essa causalidade.

Por isso os Antigos não falavam nela nos termos abstractos com que a ela nos referimos. Mas temos de reconhecer que a liberdade existe por que a política é possível.

É verdade que a filósofa tem um entendimento mais nuançado (e pessimista), tendo em conta a experiência totalitária que, precisamente, destruiu o espaço público e toda a vida política.

segunda-feira, 15 de fevereiro de 2010


(José Ames)

domingo, 14 de fevereiro de 2010

O CAOS INICIAL


"Soleil levant" (Claude Monet)


"A nossa vaidade, as nossas paixões, o nosso espírito de imitação, a nossa inteligência abstracta, os nossos hábitos estão em actividade há muito tempo e a tarefa da arte é desfazer essa actividade, fazendo-nos recuar na direcção de onde viemos para as profundezas onde o que existiu verdadeiramente permanece desconhecido entre nós."

(Marcel Proust, citado por Alain de Botton)


O impressionismo esclarece muito do método proustiano, porque a forma como o romancista descreve as suas personagens procura manter-se "fiel à confusão inicial, pintando uma impressão visual antes de esta ser anulada por aquilo que ele sabe" (Alain de Botton, falando daquela escola).

Não há dúvida que "desfazer" o trabalho do espírito para ir ao encontro da primeira impressão é também, dum certo modo, anular a personalidade e alcançar o começo do mundo, o que faz jus à opinião de que, nos grandes artistas, é o impessoal que conta.

Mas para Proust, esse começo do mundo é o próprio passado, sobretudo a idade da "confusão inicial", cujas impressões a nossa personalidade, despoticamente, chamou à sua corte ou exilou para sempre.


Vizela (José Ames)

A VERDADE DA APARÊNCIA


Paul Delvaux


"O progresso do conhecimento resume-se talvez a uma melhor compreensão da nossa ignorância."

"La Monnaie" (Robert Mosé)


Como as ilusões de óptica e os erros causadas pela aparência das coisas ( o tamanho da lua, por exemplo) podem todos ser explicados pela nossa forma e pela nossa situação, se compreendêssemos sempre por que nos enganamos e julgamos saber aquilo que, de facto, não sabemos, teríamos atingido, talvez o maior conhecimento a que podemos aspirar.

É por essa razão – era a lição de Alain – que aprendemos muito melhor, por exemplo, com os erros científicos do passado, cujo contexto e evolução podemos perceber, do que com as teorias mais recentes que nos podem surpreender, mas sem instruir.

sábado, 13 de fevereiro de 2010


(José Ames)

UM HOMEM DA IGREJA



"Como eu visse que a Assembleia aquecia e se amotinava contra o presidente de Mesme, saí, já não sei com que pretexto, e disse a Quatresous, conselheiro das Inquirições e o mais impetuoso espírito que havia na agremiação, para alimentar a escaramuça, porque eu tinha experimentado já várias vezes que o meio mais adequado de fazer passar um assunto extraordinário nas assembleias era o de excitar a juventude contra os velhos."

"Mémoires" (Cardinal de Retz)


Há homens que vivem na política como o peixe na água. Mas deixar-se flutuar ou arrastar pela corrente não era o génio de Retz. Sentimos, naquilo que escreveu, a paixão de agir e quanto o retiro final, nas palavras de La Rochefoucauld, "foi a mais falsa acção da sua vida."

Italiano, como Maquiavel, mas querendo-se francês de gema, Paul de Gondi tem o gosto do espectáculo e da improvisação fulgurante.

É talvez justa a ideia que o Co-Adjutor e os seus comparsas durante a Fronda estivessem a fazer uma espécie de peça teatral com um argumento que ele gostaria de ter escrito.

A primeira impressão destas Memórias, porém, é a de que Retz encarava a política com uma objectividade que é raro encontrar mesmo nos nossos tempos. Ele sabia que o homem integrado num corpo colectivo não se comporta como o indivíduo que era ainda há pouco, mas como um outro ser.

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010


Mértola (José Ames)

A HISTÓRIA VIVA



Arthur Stanley Eddington (1882/1944)


"O Físico: – Estranha matéria aquela que você estuda! Confessou ao princípio que não lhe dizia respeito saber se as suas proposições eram ou não verdadeiras, e agora acaba de dizer que não se preocupa sequer em saber de que é que está a falar.

O Matemático: – Aí está uma excelente definição das matemáticas puras que, de resto, já foi dada por um matemático eminente."

"Espace, Temps, Gravitation" (A.S. Eddington)


Se definirmos todo o objecto da matemática como um problema, por que é que esse problema tem de ser real e encontrar eco no modo como nos relacionamos com a natureza?

É legitimo pensar que, para além dos falsos problemas, há problemas "inúteis", quimeras do puro raciocínio, sem qualquer aplicação prática, a não ser a da ginástica mental.

Por outro lado, aquilo a que chamamos de natureza pode ser indiferente ( em relação a nós ), mas não é de certeza incoerente, visto que nós podemos pensar. Os nossos esquemas são úteis dentro dum certo âmbito e não noutros, e só são coerentes em si mesmos, por abstracção de tudo o resto.

Em última análise, o sucesso da matemática só se pode explicar pela evolução da espécie no seu contexto terráqueo. Por isso, tinha razão Platão ao dizer que, de facto, não aprendemos, mas nos lembramos das ideias, como se tivéssemos vivido outra vida.

Na matemática encontramos a história viva da nossa aprendizagem de estruturas como o tempo e o espaço.

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010


(José Ames)

HOMO PARTIDARIUS


http://www.bulkpartysupplies.com


"Eu pensava nestes problemas que a escolástica confunde, procurando saber através de que sinais poderia reconhecer se um homem é republicano ou não, radical ou não, socialista ou não. Orientar assim a observação é fazer um mau uso das classes; porque todo o homem é em qualquer grau republicano e em qualquer grau socialista, mesmo César e Napoleão; e há muitas outras ideias a aplicar a um homem, se o queremos conhecer um pouco. A idade importa muito, e a gordura, e o estado do fígado, sem contar com a riqueza, a função, mil outros atributos, que acabarão em conjunto, por nos permitir uma previsão passável."

"Vigiles de l'esprit" (Alain)


As classes pouco nos dizem sobre o homem e, como diz o filósofo, numa crise ou numa guerra, as etiquetas não nos servem para prever o seu comportamento. Para nos aproximarmos disso, é preciso conhecer o homem todo.

Mas esta sabedoria aplica-se à infância dos partidos. Porque quando eles absorvem toda a vida política e, sobretudo, se são "monitorizados" pelos meios de comunicação, a etiqueta conta mais do que a psicologia ou a análise sociológica para compreender uma nova espécie política.

É então ainda mais verdade que todo o homem está, nalgum grau, mal classificado. Mas esses "erros" de atribuição são o que permite a flexibilidade relativa das etiquetas frente à realidade social.

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010


Lisboa (José Ames)

FECHAR O JOGO



"Procura-se o sentido da história. Ora aquele que crê que a história tende para um fim está muito perto de não se contentar em pensar esse fim e de erigir planos para o realizar. Mas, ao fazer isso, ele mostra-nos qual é a sua impotência. Os planos temerários que os detentores da força pretendem basear sobre um conhecimento total da história afundam-se em catástrofes. Os planos que traçam no seu círculo estreito indivíduos isolados fracassam também; ou então alcançam, pela intervenção de outros factores, uma situação completamente diferente, tendo um outro sentido que não figurava em nenhum plano. O curso da história surge-nos como uma máquina de moer à qual ninguém escapa, ou então com um sentido com infinitas interpretações, que se manifesta contra toda a expectativa, através de acontecimentos novos, que permanece sempre equívoco, um sentido que nunca conhecemos mesmo quando nele confiamos."

"Introduction à la Philosophie" (Karl Jaspers)


Eis Hegel revisto depois das catástrofes do século XX. A história não é a história do Espírito revelando-se a si próprio. A própria ideia do progresso sofreu um revés definitivo. É inútil, pois, pressupor que ela tem um fim.

"Mas a filosofia da história exige que se procure o sentido, a unidade, a estrutura da história universal. Esta não pode visar senão a humanidade inteira." (ibidem)

Deixemos de lado a questão de saber se hoje é possível uma filosofia da história como seria a dum hegelianismo revisto. Não tem o sentido a mesma força de precipitação que a "tendência para um fim"?

O perigo duma tal visão das coisas reside na ideia dum falso poder operacional, uma vez "correctamente" interpretado o sentido da história.

A história seria, assim, um sistema para parar o jogo e fechar todas as saídas.

terça-feira, 9 de fevereiro de 2010


(José Ames)

O LEGADO ROMANO


http://www.immersiveeducation.com


"Todo o artista italiano alia à maturidade o esforço de justificar a obra pela tradição; e além disso, por instinto atávico, quase sem advertir vai calando os remorsos que lhe deixam as suas inovações reafirmando-a onde pode na vida privada. Um italiano garante-se sempre, vive entre pesos e contrapesos, é revolucionário e conservador ao mesmo tempo, e esta é a sua lei."

"Viaggio in Italia" (Guido Piovene)


Ao ler estas linhas, não posso deixar de recordar o que diz Hannah Arendt sobre a tríade romana da religião, autoridade e tradição, tríade que não funciona desfalcada duma das suas partes.

O italiano de que fala Piovene, mesmo quando se julga próximo, pelas ideias, dum artista moderno, cedo verifica que isso não corresponde à verdade. Isso tem a ver com o culto do passado que foi o legado do Império que a Igreja Católica com tanto sucesso assimilou.

"Foi só quando isso se produziu, somos tentados a dizer, que a fé cristã se tornou uma "religião", não apenas no sentido pós-cristão, mas no sentido antigo também." (Hannah Arendt)

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010


Gaia (José Ames)

A LIBERDADE DO LACRAU



Sören Kierkegaard (1813/1855)


"Por isso o demónio não aparece claramente senão em contacto com o Bem, que vem de fora rondar em torno dos seus confins. E por isso é digno de menção que nos Evangelhos o demoníaco não se revele antes da vinda de Cristo; e seja o demoníaco legião (veja-se Mateus, VIII, 28-34, Marcos V, 1-20, Lucas, VIII, 26-39) ou seja mudo (Lucas, XI, 14), o fenómeno permanece idêntico: há sempre a angústia do Bem."

"O Conceito de Angústia" (Sören Kierkegaard)


Pergunto-me se estas elucubrações do teólogo dinamarquês são assim tão anacrónicas como parecem, hoje, quando o Limbo se extinguiu e o Inferno pouco mais é do que uma metáfora sartriana.

Kierkegaard diz que "se a escravidão do pecado é uma relação forçada com o Mal, o demoníaco se apresenta como uma relação involuntária com o Bem."

A ideia é, portanto, que a liberdade é necessária ao regime demoníaco. E não é assim que distinguimos entre, por um lado, o vício e todas as formas de loucura do catálogo psiquiátrico e, por outro, a vontade de fazer mal (conscientemente, porque se tem, ao mesmo tempo, alguma ideia do bem)?

Mas pode-se defender esta última como um outro tipo de necessidade: a do carácter ou da natureza, e que se revê na fábula contada por Orson Welles do escorpião e da rã. A lógica leva a rã a correr o perigo de levar o aracnídeo às costas na travessia do rio, mas a natureza do escorpião leva-o a atacar, afundando-se ambos.

Parece assim que o demoníaco é por de mais humanista, assentando numa ideia da liberdade que, de facto, pressupõe o homem no centro do mundo (à imagem do seu "Criador"). É essa altura que cava o abismo.

domingo, 7 de fevereiro de 2010


(José Ames)

A LIÇÃO DE SCHUMANN


Robert Schumann (1810/1856)


"Quando alguém me pergunta como é que se pode ter um sentido intenso que não se compreende, só do lado da música podemos procurar uma resposta. É por isso que me lembro sempre duma anedota muito importante de Schumann, que é duma importância crucial para o meu ensino. Ele acabava de tocar um estudo muito difícil e um dos seus estudantes perguntou se ele o podia explicar. "Sim", disse Schumann, e voltou a tocá-lo. Para mim, é capital."

(George Steiner, entrevista a Ronald Sharp)


Porque tudo o que excede a nossa "modesta paisagem" (e isso é o infinito) tem que ter um sentido para nós, mesmo quando não o podemos explicar.

A resposta de Schumann está à altura da sabedoria oriental e da resposta paradoxal que ali o discípulo sempre recebe do mestre. Vai ao encontro também da ciência mais avançada. Como diz H. Pagels, a única simulação possível, para lá duma dada complexidade, é a própria realidade que se quer simular.

A música, para Steiner, é o que não se pode traduzir e que é, ao mesmo tempo, um laço com a transcendência: "Sim, ela não se pode parafrasear nem metafrasear. Qual é o sentido? Por que é que sabemos o que a música quer dizer? Que queremos dizer pelo "seu sentido"?

sábado, 6 de fevereiro de 2010


Setúbal (José Ames)

INFERNALIA


Armand Jean du Plessis, Cardeal de Richelieu


"Depois do assassinato de Henri IV, uma criança de doze anos foi morta por ter dito publicamente que faria o mesmo ao pequeno Louis XIII. Richelieu começou a sua carreira por um discurso em que pedia ao clero para proclamar a condenação de todos os regicidas; dava como motivo que os que alimentavam este desígnio eram animados por um entusiasmo demasiado fanático para serem contidos por qualquer pena temporal."

"L'Enracinement" (Simone Weil)


O cardeal brandia as penas eternas para o que atentasse contra a vida do "representante de Deus na terra", pelas mesmas razões por que Platão não prescindia do Hades. Era preciso que o castigo perseguisse o criminoso para além da morte.

Para o filósofo, é quase certo que o Inferno fosse apenas um papão para consumo político, ao nível da linguagem parabólica que ele julgava necessária para moderar os homens que não nasceram para filósofos. Talvez Richelieu, como político, não pensasse de outro modo.

À medida que se foi separando do poder temporal, a Igreja ficou mais livre para abandonar os papões. Mas no século de Armand-Jean du Plessis, o medo do Inferno não chegava.

Como diz um manual da Inquisição de 1578, "a punição não se destina em primeiro lugar e per se à correcção ou ao bem da pessoa punida, mas ao bem público, de modo a que outros fiquem aterrorizados e afastados dos males que poderiam cometer."

sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010


(José Ames)

VISÕES DE KAFKA



"K. torna-se um acessório, aterrado mas impaciente, do crime que contra ele mesmo é cometido. Em todos os suicídios existe simultaneamente apologia e aquiescência. Como declara o Capelão, na mais desesperada das zombarias (mas será que o é?): 'o Tribunal nada quer de si. Recebe-o quando você chega, despede-o quando sai.' A fórmula está deliberadamente próxima duma definição da vida humana, da liberdade de ser culpado, que é a do homem caído."

"Uma nota sobre 'O Processo' de Kafka" (George Steiner)


No princípio do livro de Kafka, a culpa insinua-se no próprio modo de falar e na dúvida sobre a pronúncia e a ortografia das palavras. O "Tribunal", aqui muito mais do que uma reunião presidida por um juiz, é um corpo em expansão cancerosa que pode surgir logo atrás do tabique numas águas-furtadas ou ao lado da despensa, começa por pôr K. fora da língua materna.

A liberdade de K., na verdade, uma diabólica ironia, é a de aceitar uma responsabilidade que nada tem de pessoal (podia ser a dos descendentes até à quinta geração duma maldição sagrada), ou excluir-se da humanidade.

A frase do Capelão sobre a indiferença do Tribunal, que não tem, evidentemente, o sentido da isenção, revela o interior do mecanismo duma necessidade estranha em relação à anankê dos Gregos que submete deuses e homens, pois pode passar sem eles (tornando-os "acessórios"). Isso tanto podia ser o "ponto de vista de Sírius" (dando-nos uma importância microscópica), como o da auto-suficiência da lógica.

quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010


Bom Jesus (José Ames)

JOVENS E VELHOS


Aristóteles e Homero (Rembrandt)


"Pelo contrário, na educação, temos sempre que lidar com pessoas que não podem ainda ser admitidas na política e na igualdade porquanto estão em vias de se preparar para isso. O exemplo de Aristóteles tem, no entanto, todo o sentido, porque é verdade que a necessidade de 'autoridade' é mais plausível e evidente na criação da criança e na educação do que em qualquer outra parte. Eis por que é tão característico do nosso tempo querer extirpar até esta forma extremamente limitada e politicamente sem importância de autoridade."

"La crise de la culture" (Hannah Arendt)


Arendt chama a atenção para a impropriedade da explicação aristotélica para a diferença entre dirigentes e dirigidos que ele deriva da diferença natural entre jovens e velhos que é uma relação pedagógica "por essência".

Contudo, é essa ideia que está por detrás de algumas formas de paternalismo recorrentes na política contemporânea, através de noções como partido-vanguarda, timoneiro ou grande educador.

Na política, a autoridade só poderia ter curso se, a exemplo dos Romanos, reconhecêssemos ter alguma coisa a aprender com os antepassados, os "maiores", por definição. Mas sem isso, o modelo da educação só serve para esconder a vontade de dominar ("Qu'est ce que l'autorité?").

Entre iguais, a autoridade é sempre problemática. E o que a nossa época tem de novo é que os jovens, mesmo os mais jovens, encontraram na tecnologia um acesso rápido a uma espécie de igualdade que põe em causa a própria relação pedagógica.