segunda-feira, 22 de janeiro de 2007

LÁ LONGE A MENINA NUA


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"Mas eles calaram-se; debaixo da agitação dos trémulos do violino que a protegiam com a sua vibração à distância de duas oitavas - e como num país de montanha, por detrás da imobilidade aparente e vertiginosa duma queda de água, nos apercebemos, duzentos pés mais abaixo, a forma minúscula duma viajante - a pequena frase acabava de aparecer, longínqua, graciosa, protegida pelo longo rebentamento da cortina transparente, incessante e sonora."

"Du côté de chez Swann" (Marcel Proust)


Trata-se da pequena frase musical do andante da sonata para violino e piano de Vinteuil, talvez a mais famosa das composições que nunca existiram.

E é o hino do amor de Swann e Odette.

Naquela descrição há toda uma arquitectura característica da música.

A delicadeza da frase é protegida pela distância e pelos acidentes da paisagem. Como se a sensibilidade do "melómano" fosse uma questão de posição no espaço. Ou de estar, entre as formas que se movem, num ponto privilegiado.

Penso na estátua da menina nua naquele centro deserto da Avenida dos Aliados. Ocupando, na sua desproporção, um lugar do sentido e da memória, mais do que o centro real.

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