Galileu Galilei
Leio em Popper ("Conjecturas e Refutações") que o cardeal Bellarmino, um dos inquisidores já no processo contra Giordano Bruno, não se opunha à teoria heliocêntrica de Galileu, como, de resto, o próprio papa...
O problema era que a comodidade assim obtida nos cálculos, de acordo com a observação, fosse mais do que uma aparência:
"(...) Galileu agirá avisadamente se falar hipoteticamente, ex suppositione...; dizer que descrevemos melhor as aparências supondo a Terra em movimento e o Sol em repouso do que se usássemos excêntricos e epiciclos é falar acertadamente. Não há perigo nisso, e é tudo aquilo de que a matemática necessita."
Karl Popper compara esta atitude com o instrumentalismo, hoje, segundo ele, a "perspectiva oficial" da teoria física e que se tornou "parte do actual ensino da Física."
"(...) Aquilo que actualmente lhes interessa, enquanto físicos, é (a) o domínio do formalismo matemático, i.e., do instrumento, e (b) as suas aplicações; e não querem saber de mais nada." (ibidem)
Este abandono da tradição galilaica ( o verdadeiro conhecimento por detrás dos fenómenos, como todo o platonismo) é explicado por Popper "pelas dificuldades na interpretação do formalismo da Teoria Quântica" e pelo "espectacular sucesso prático das suas aplicações." (ibidem)
É vertiginoso pensar-se que hoje tão poucas diferenças, a nível filosófico, existam entre a atitude da Inquisição, que zelava pelo respeito da letra dos Evangelhos e a da Física moderna que postula a existência de um mundo em que a verdade é independente daquilo que "a matemática necessita".
A ciência pode desenvolver-se, então, num mundo de aparências e de experiências bem sucedidas, sem que a religião, fosse ela a mais obscurantista, encontrasse contra ela qualquer objecção.
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