"Os homens que mais se salientam pelas suas qualidades espirituais e morais não dispõem de meios para transmitirem aos outros as qualidades que os distinguem, a sua arete. Péricles, pai dos dois jovens aqui presentes, deu-lhes uma educação excelente em tudo aquilo para que existem professores, mas naquilo em que a sua própria grandeza se firma ele não os educa nem os entrega a outro para que os eduque, antes os deixa andar à solta, para "se instruírem livremente", como se a arete fosse por si própria pousar sobre eles."
"Paidéia" (Werner Jaeger)
Este trecho, retirado da análise que faz Jaeger ao "Protágoras" de Platão, ilustra uma espécie de lei na sucessão dos talentos e da virtude, muitas vezes verificada na história.
Quantos filhos como Cómodo, indignos do seu pai, como se incapazes de o imitar, devessem seguir o caminho precisamente oposto!
A técnica ensina-se, os talentos podem cultivar-se, mas a virtude de cada um parece não querer outro mestre do que a experiência da liberdade, para, através dos erros, conhecer cada um a sua natureza.
E esta ideia de que a virtude própria (a arete) descerá como um pássaro no final da aventura é uma ideia muito próxima da graça.
Pois esse pousar é imprevisível e pode não corresponder ao esforço despendido.
Não só é um pássaro rebelde como na "Carmen", como o seu capricho depende dos inumeráveis encontros duma vida.
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