segunda-feira, 18 de junho de 2007

A INJUSTIÇA COMO PREFERÊNCIA


"José e os seus irmãos" (MAULBERTSCH, Franz Anton)


"Este crime, o narrador o mostrará, está carregado de uma profunda ambiguidade. Não se presta somente a representar a psicodinâmica do ciúme e o mistério da injustiça, mistério indissociável do amor que acorda uma preferência; ele oferece ao mesmo tempo uma admirável ocasião de tratar o problema do regresso ao Egipto, que só se pode abordar, num primeiro tempo, sob a forma blasfematória."

"Derrida, un égyptian" (Peter Sloterdijk)


Sloterdijk comenta o romance de Thomas Mann "José e os seus irmãos". Como se sabe, na narrativa bíblica, José distingue-se pela sua capacidade de interpretar os sonhos e de "melhor compreender os homo-egípcios do que eles se compreendiam a si mesmos".

Assim, o crime dos irmãos contra o favoritismo de Jacob pelo filho mais novo, o "mistério" do amor que não adere espontaneamente aos ditames da razão e ao princípio da igualdade (terá toda a injustiça origem numa "preferência" da natureza, como aqui?), acabou, como diz o filósofo, por ilustrar o ditado de "Há males que vêm por bem" e de dar lugar a um outro favoritismo, desta vez, do faraó pelo estrangeiro, fundado apenas na sua "capacidade hermenêutica".

A profecia de um tempo de vacas magras depois de um de vacas gordas terá sido útil ao Estado, mas antes disso revelava já, em José, o que parecia uma preferência dos deuses, os quais lhe desvendavam, a ele, alguns dos seus segredos.

E nesta história o que está mais presente é esse arbitrário poder que intervém na vida dos homens para escolher aqueles que serão o seu instrumento.

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