segunda-feira, 18 de junho de 2007

NUVENS SOBRE O LAGO


"A Gaivota" pelo Teatro da Cornucópia

Finalmente, consegui ver "A Gaivota", de Tchekov, encenada por Luís Miguel Cintra.

E o milagre aconteceu mais uma vez. Os actores conseguiram recriar o mundo poético do grande dramaturgo.

Mais uma vez, o destino (que melhor palavra para traduzir a impossibilidade de isolar a acção humana dos seus antecedentes e das suas consequências, na sua verdadeira dimensão "cósmica"?) se serve de um homem amável, nem sequer inconsciente do significado dos seus actos, honesto quanto aos seus méritos de escritor e bom juiz da vaidade humana, que "passa, e não tendo mais que fazer", destrói o ser livre e belo que voa sobre o lago.

O facto de Trigorin ter resumido o drama antes dele ser vivido e em que irá representar o papel do destruidor, de o vermos depois da desgraça de Nina, como se tudo lhe tivesse passado ao lado e sem ele, parece sugerir que estamos diante de um caso particular do fatalismo russo.

Mas é só porque na posição do espectador e no tempo do espectáculo, as personagens nos parecem o mesmo homem ou a mesma mulher. Na vida real, podemos tornar-nos irreconhecíveis sem dar por isso.

No final, ouve-se um tiro e, como dizia Gorki, alguém fez o que tinha a fazer, acabando com a vida.

Os actores secundários vão muito bem. O velho Peter Sorin, interpretado por Cintra, é vivo como as coisas vivas. Teresa Sobral, no papel de Irina, é a graça sobre as tábuas. Memorável, memorável.

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