quarta-feira, 29 de outubro de 2008

PASSAMENTO EM SAINT-CLOUD


Luís XIV e o irmão, duque de Orleães


"Com a partida do Rei a multidão esvaziou de Saint-Cloud pouco a pouco, de tal maneira que Monsieur morrendo, lançado num sofá (lit de repos) no seu gabinete, ficou exposto aos ajudantes de cozinha e aos sargentos, os quais, a maior parte por afeição ou por interesse estavam muito comovidos. Os primeiros oficiais e outros que perdiam cargos e pensões faziam vibrar o ar com os seus gritos, enquanto que todas aquelas mulheres que estavam em Saint-Cloud, e que perdiam a sua consideração e todo o seu divertimento, corriam de um lado para o outro desgrenhadas como bacantes."

"Mémoirs" (Duc de Saint-Simon)


Luís XIV chorou a morte do irmão, que amava muito. Quis o azar que nesse mesmo dia tivessem discutido por causa dos filhos (o duque de Chartres tratava mal a filha do rei). O rosto apoplético de Monsieur levou mesmo o irmão a aconselhar que fosse sangrado. Mas o médico de Monsieur estava velho e sangrava mal e este, para não lhe fazer uma desfeita, "teve a bondade de não querer ser sangrado por nenhum outro e disso morrer." (ibidem)

Saint-Simon, depois de relatar a cena do passamento, dedica um capítulo, como o teriam feito os clássicos latinos, ao carácter do homem.

"A sua familiaridade obrigava e a sua grandeza natural conservava-se sem repelir, mas também sem tentar os estouvados a abusar dela."

Vemos pela reacções dos que ficaram a velar o morto, em Saint-Cloud, como o desgosto mais sincero se aliava ao mais material dos interesses.

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