quinta-feira, 30 de outubro de 2008

O HOMEM DOS BINÓCULOS


Fabre d'Eglantine (1750/1794)


"Ele deu voltas e mais voltas a esta vã alegação, repetindo toda a história do girondismo. Fabre não aguentou mais e, perdendo a paciência, levantou-se para sair. Mas, neste momento, Robespierre, assentando no homem dos binóculos as suas lunetas e o seu olhar fulvo, pediu-lhe que esperasse. E prosseguiu, furioso, sobre os intrigantes, as serpentes que era preciso esmagar (aplausos unânimes). "Falemos da conjuração, e não mais de indivíduos..." E nesse momento: "Peço que este homem que só se vê de binóculos e que tão bem sabe expor intrigas no teatro, se digne explicar-se aqui...E veremos como se sairá desta..."

"História da Revolução Francesa" (Jules Michelet)


Como se vê, o Incorruptível faz exactamente o contrário do que diz, continuando a falar de indivíduos.

Fabre d'Eglantine tinha de morrer e para isso era preciso implicá-lo numa conjura imaginária. Robespierre podia "mandar julgar sem provas ou matar sem julgamento", desde que continuasse a ser temido.

O que ele sentia como um grande perigo era a acusação de indulgência. Por isso, contra o seu carácter, o seu pensamento de padre, tinha de estar sempre do lado da opinião mais violenta. Daí a sua aliança táctica com os hebertistas.

Mas pior do que parecer fraco perante os traidores e os inimigos da nação era prestar-se ao ridículo. Tudo nele era gravidade, mas a um passo de se tornar mecânico e imensamente cómico. E era por aí que Fabre o apanhava. Autor de mérito, "a sua natureza era fina, forte, ardente, mas não era elevada". O lado elevado do Incorruptível não lhe era acessível. Só via um homem de casaca verde impecavelmente escovada a saltar duma opinião para outra. Os binóculos que assestava na assembleia e nos oradores eram o símbolo duma distância mortal e de como no drama político, ele procurava, sobretudo, material para a peça que tinha na cabeça. Danton disse dele: "A cabeça deste homem é um repertório de ideias cómicas".

Apesar de inocente, Fabre d'Eglantine foi ao encontro da guilhotina. O seu destino é bem a prova de que a posição de observador não é sempre isenta de riscos.

Fabre podia ser considerado um percursor do jornalismo de guerra e, mesmo se escrevia para o teatro, sabia do que falava.

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