"O amor é uma doença, sabemo-lo, ou melhor, não o sabemos suficientemente. Casanova faz aqui um estudo exaustivo (pensamos, uma vez mais, no narrador da Recherche, cujo verdadeiro órgão sexual, é, afinal, a inveja). Mas Casa colabora com a sua patologia, mostra-se activo, dir-se-ia que quer esgotar a força. Chegamos, assim, à explosão última antes do risco de depressão e a uma admirável descrição da possessão maníaca."
"Casanova, o admirável" (Philippe Sollers)
Para dizer como Sollers, qual é o verdadeiro órgão sexual do libertino?
Para sabermos isso, temos de afastar o véu de Maia da primeira leitura, da explícita procura do prazer através dos encontros amorosos.
Proust talvez tenha sido um snob impenitente, mas apesar de não ter ilusões sobre a "nata" social em que procurava integrar-se e a que se julgava superior pelo espírito, não deixava de se sentir um estranho, como o Swann abandonado, do fim da vida, que reconheceu no judaísmo a sua verdadeira casa.
Na grande narrativa, ele restabelece a justiça, apresentando a elite mundana desprovida de quaisquer títulos à auto-justificação. Se esta é a obra da inveja, é duma inveja julgada que em vez da frustração produz o olhar compassivo sobre todo o humano.
Mas Casanova, a quem a velhice obriga à revisão da vida e à triste prudência, escreve para salvar a sua colecção, o seu catálogo donjuanesco, da deformação da memória e do esquecimento.
E Sollers vem em defesa do falso sedutor: "Brincou, por vezes, com alguns dos seus partenaires mas, como ele próprio explica, era a vontade deles, não a sua, e qualquer outro teria abusado igualmente deles, e tê-lo-ia feito menos bem."
Deveríamos então tomar à letra a sua divisa: "Sequere Deum"? E seria a complacência o "órgão sexual" deste devoto paradoxal?
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