sábado, 10 de dezembro de 2011

PALIMPSESTO



"Uma noite, tranquilamente escondido debaixo duma figueira, olhava uma estrela com essa paixão curiosa de que são presa as crianças, e à qual uma precoce melancolia acrescentava uma espécie de inteligência sentimental(...)"

"Le lys dans la vallée" (H. de Balzac)


Antes de podermos pensar a relação das coisas, na sua objectividade, e como que separadas de nós, só podemos pensar o seu efeito em nós, como se, de alguma maneira, estivéssemos a elas ligadas. É isso que explica a conhecida ilusão dimensional da infância. As ruas e as casas em que vivemos nessa idade parecem-nos, mais tarde, muito mais pequenas.

Alain diz que começamos a conhecer o mundo ao colo de gigantes que obedecem aos nossos caprichos. Todos tivemos, por um tempo, a lâmpada de Aladino.

Mas, na realidade, o tornarmo-nos mais crescidos e depois adultos é um processo de desaprendizagem desse mundo mágico. O que aprendemos a seguir é um palimpsesto, porque o que sentimos pela primeira vez permanece coberto pela nova "escrita".

E às vezes, quando menos esperamos, a nossa inteligência volta a ser sentimental e o mundo a parecer-nos uma realidade inseparável de nós.

0 comentários: