terça-feira, 20 de dezembro de 2011

FANTOMAS





Daquela vez, na banheira, pensei em Fantomas e no seu crime por sugestão. A vítima, amarrada a uma cadeira, sente fugir-lhe um fio de sangue pelo braço. Uma venda impede-a de perceber que o facínora tinha aberto a torneira de água quente. A via do tratamento pela água para o crime perfeito.

A criminologia do herói de Pierre Souvestre e Marcel Alain é um Kama Sutra. O inspector Jouve, a antítese fraterna, é o factor velocidade. Por sua causa, o bandido imagina os golpes mais audazes e fulgurantes. Há quase uma contiguidade física entre o criminoso e o justiceiro, este falhando o outro por segundos. É a quase metamorfose: O Dr. Jekyll falha o encontro com Mr. Hyde, isto é, consigo mesmo.

Lady Beltham não é uma clandestina, mas uma urna de vidro. Essa figura que se anima pela única vontade de Fantomas é a bela adormecida. Fandor, nome de ressonância eslava, é o comentário do génio. Para não se dissolver na música, a acção trágica cinde-se na fala magistral e no sentimento de assombro.

Fantomas é apresentado como uma criatura diabólica. Na sua natureza, há o insondável do psíquico, organizado como um segredo portador de morte.

A máquina do prazer em Sade é um jogo infinito. A morte, como mostrou Barthes, é contrária à economia do castelo-refúgio. Mas Fantomas tem o mundo debaixo da sua sombra. O seu prazer não olha a gastos. E a morte é o último fetiche duma lógica poética que não põe fim à vida, nem se alimenta da nossa angústia.

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