sexta-feira, 6 de janeiro de 2006

SILÊNCIO, ESCURIDÃO E NADA MAIS


"O silêncio" (1963-Ingmar Bergman)

Bergman diz que, para ele, "o cinema é antes de tudo teatro." Tudo é teatro desde a sexualidade às relações com Deus.

Nesta afirmação paradoxal (que Oliveira subscreveria) temos talvez a chave para a compreensão dum filme como "O silêncio".

Nos primeiros minutos a acção passa-se numa carruagem, com duas mulheres e uma criança. Não se ouve um som, nem de palavras, nem do comboio que desliza através dum país estrangeiro.

A mãe dorme, ressudando sensualidade, enquanto o rapazinho olha pela janela. A outra mulher parece sofrer e a certa altura tem uma hemoptise.

Com o aparecimento do som, vamos continuar no silêncio entre os seres. As duas irmãs, de temperamentos opostos, não têm nada a dizer uma à outra.

Penso entender aquela ideia assim: é quando convertemos a vida, o que dizemos e fazemos na realidade, em diálogos e cenas que tudo ganha um sentido. Recorremos a máscaras e a personagens, a um enredo e até a um palco ("life is a stage" já dizia Shakespeare) para compreender.

O que nos fica da torrente da vida sem a "encenação" que a nossa memória e a nossa sensibilidade, conscientemente ou não, constroem?

A verdade da vida não é o sentimento da vida, mas a história (a peça) que nos dá uma voz e um papel.

Aquelas personagens não "funcionam" e, assim, é o não-sentido que é objecto da encenação.

O filme é o desfecho da "Trilogia do Silêncio", formada ainda por " Através de um Espelho" e " Luz de Inverno", sobre o silêncio de Deus.

1 comentários:

TR disse...

Bergman é um dos meus favoritos, mas devo confessae que não conheço nenhum destes filmes desta trilogia.... Foi bom ler...