sábado, 20 de agosto de 2011

UM FRANCISCANO






Liszt nunca foi um eremita, mas sentiu-se sempre tentado a sê-lo. Cortejado por mundanos e homens da Igreja, fascinando o público feminino e inspirando grandes amores, como o de Marie d’Agoult, não era fácil (e, no fundo, não queria) desprender-se de tantos liames, ele que apreciava um certo inebriamento, o dos aplausos, nem é preciso dizê-lo, mas também o do tabaco ou dum conhaque relaxantes.

Caindo nas graças de Pio IX, que o designava pelo “mio Liszt” e lhe proporcionou uma espécie de retiro no Monte Mario, quis tornar-se franciscano sem renunciar ao mundo brilhante que era o seu. “Mas esqueço que não tenciono de nenhum modo tornar-me monge, no sentido religioso do termo. Falta-me a vocação para esse efeito, e basta-me pertencer à hierarquia da Igreja no grau que as ordens menores me atribuem. Não vesti, pois, o burel mas a sotaina. A este respeito, Vossa Alteza perdoar-me-á esta ligeira vaidade de lhe contar que já me fizeram o elogio de dizer que visto a sotaina como se sempre a tivesse vestido.” (carta ao príncipe Constantin von Hohenzollern-Hechingen)  Liszt, na ocasião, serve-se dum velho aforismo para dizer que se o hábito não faz o monge, tampouco o impede…

O autor da sua biografia (Frédéric Martinez) diz noutra passagem que Liszt nunca andava longe da ingenuidade. Por isso, alguns abusavam da sua genuína bondade. Foi talvez essa ingenuidade que tornou possível a personagem deste abade desconcertante.

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