segunda-feira, 16 de maio de 2011

A VIRGEM ABRIDEIRA





Se um homem só no final da sua vida pode dizer que foi feliz, como queria Sólon, a ideia da coroação é como o juízo definitivo sobre o percurso terreno, não importando os declives, nem as “descidas aos Infernos”, os momentos de dúvida ou de angústia, tudo, na conclusão, se submete à teia do sentido. A história está escrita na forma em que deve ser contada, e essa história é edificante.

Numa aldeia da província de Ourense, na Galiza, Allariz, há um tesouro guardado no convento de Santa Clara (dizem que tem o maior claustro de Espanha): é a “Virgen Abrideira”, uma estatueta de marfim que abre e revela sete cenas representando os gozos de Maria no Paraíso: Anunciação, Nascimento de Jesus, Ressurreição,  Ascensão e Coroação.

Como acontece em todas as orações fúnebres, é a história luminosa a única a que se faz referência. Tudo o que a tornaria verdadeiramente humana é piedosamente silenciado, porque  a condição de mortal já não é. Os gozos do Paraíso não são prometidos a quem morre, mas aos “deuses” em que nos tornamos.

1 comentários:

Anónimo disse...

De facto, até parece que Humanidade e Paraíso não se cruzam.
Felizmente que há vidas humanas que no próprio Inferno nos convidam ao Paraíso, ali mesmo, sem mais demoras. Estou a pensar em Etty Hillesum.
A iconografia religiosa contém esse estranho paradoxo humano, eu acho.

Maria Helena