Funeral de Konstantin Chernenko |
“Muitas
decisões importantes nesta altura estavam suspensas da questão de quem era a
pessoa sénior na liderança que ia morrer primeiro. Esta era uma consequência
natural de, no tempo de Brezhnev, se ter permitido que a inteira liderança de
topo envelhecesse em conjunto. Nos começos de 1982, o ano que viu a morte,
primeiro, de Suslov e mais tarde Brezhnev, a média de idades no Politburo
ultrapassava os 70 anos. Andropov, com uns ‘meros’ 68 quando se tornou líder
soviético, tinha começado a receber tratamento de diálise para uma deficiência
renal logo em Fevereiro de 1983, quatro meses depois da morte de Brezhnev.”
“The Gorbachev Factor” (Archie Brown)
Se não fosse a maior
probabilidade de morrer nos mais velhos, o Politburo era a imagem de uma
perfeita estabilidade, só comparável à das monarquias absolutas. Mas, ao
contrário destas, não era hereditário. A cooptação remediava esse inconveniente,
embora com a desagradável consequência da rotação no poder se acelerar até à
rarefacção do pequeno grupo de gerontes. Chernenko, também ele breve, foi o
último travão à entrada de sangue novo.
O desfasamento entre
a nova geração e a gerontocracia teve efeitos tão desastrosos como a entrada do
ar nos frescos duma cripta ( estou a lembrar-me de “Roma” de Fellini, e como
alguns desses frescos, descobertos pelas escavações do metropolitano, só
tiveram tempo de ser fotografados antes de se perderem para sempre).
Com a velocidade das
comunicações à escala do globo, o isolamento é um trabalho de Sísifo. Não é por
acaso que a democracia americana é o regime mais duradouro que se conhece nos
tempos modernos. É também o mais adaptável à mudança e à contínua reestruturação
económica. Mas essa democracia não é apenas um regime. Faz parte do mito da
Fundação do Estado. A divisa, “In God we
trust”, no seu dinheiro, não é um sinal de materialismo, mas de que a
América é abençoada, e por isso a ideia de “vil metal” não faz sentido. Esse
país será o último a pôr em causa a genuinidade do poder de representação. Ali,
é inconcebível a crítica de certa esquerda europeia de que o poder do povo é
apenas o de votar de tantos em tantos anos. Os americanos são verdadeiros
crentes.
Mas em que poderiam
acreditar os soviéticos, quando o poder que os governava tinha chegado à
situação de se barricar contra qualquer tipo de reforma e apenas pensava em
garantir um final de carreira confortável, ao abrigo de quaisquer sustos?
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