quinta-feira, 14 de abril de 2011

A TORRE DOS GERONTES

Funeral de Konstantin Chernenko




“Muitas decisões importantes nesta altura estavam suspensas da questão de quem era a pessoa sénior na liderança que ia morrer primeiro. Esta era uma consequência natural de, no tempo de Brezhnev, se ter permitido que a inteira liderança de topo envelhecesse em conjunto. Nos começos de 1982, o ano que viu a morte, primeiro, de Suslov e mais tarde Brezhnev, a média de idades no Politburo ultrapassava os 70 anos. Andropov, com uns ‘meros’ 68 quando se tornou líder soviético, tinha começado a receber tratamento de diálise para uma deficiência renal logo em Fevereiro de 1983, quatro meses depois da morte de Brezhnev.”

“The Gorbachev Factor” (Archie Brown)




Se não fosse a maior probabilidade de morrer nos mais velhos, o Politburo era a imagem de uma perfeita estabilidade, só comparável à das monarquias absolutas. Mas, ao contrário destas, não era hereditário. A cooptação remediava esse inconveniente, embora com a desagradável consequência da rotação no poder se acelerar até à rarefacção do pequeno grupo de gerontes. Chernenko, também ele breve, foi o último travão à entrada de sangue novo.

O desfasamento entre a nova geração e a gerontocracia teve efeitos tão desastrosos como a entrada do ar nos frescos duma cripta ( estou a lembrar-me de “Roma” de Fellini, e como alguns desses frescos, descobertos pelas escavações do metropolitano, só tiveram tempo de ser fotografados antes de se perderem para sempre).

Com a velocidade das comunicações à escala do globo, o isolamento é um trabalho de Sísifo. Não é por acaso que a democracia americana é o regime mais duradouro que se conhece nos tempos modernos. É também o mais adaptável à mudança e à contínua reestruturação económica. Mas essa democracia não é apenas um regime. Faz parte do mito da Fundação do Estado. A divisa, “In God we trust”, no seu dinheiro, não é um sinal de materialismo, mas de que a América é abençoada, e por isso a ideia de “vil metal” não faz sentido. Esse país será o último a pôr em causa a genuinidade do poder de representação. Ali, é inconcebível a crítica de certa esquerda europeia de que o poder do povo é apenas o de votar de tantos em tantos anos. Os americanos são verdadeiros crentes.

Mas em que poderiam acreditar os soviéticos, quando o poder que os governava tinha chegado à situação de se barricar contra qualquer tipo de reforma e apenas pensava em garantir um final de carreira confortável, ao abrigo de quaisquer sustos?

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