sexta-feira, 15 de abril de 2011

OS NÚMEROS IMAGINÁRIOS




Revi o primeiro filme de Volker Schlöndorff, de 1966, “Der junge Törless”, inspirado no romance de Robert Musil.

Esta história sobre a “banalidade do mal”, escrita no princípio do século XX, antes das duas guerras mundiais e da célebre análise de Hannah Arendt e do termo com que cunhou toda uma época, só pode ser premonitória.

Törless, ao contrário de Beineberg e de Reiting, que se “revelam” torcionários na perseguição do mais fraco (Basini), torna-se cúmplice apenas para compreender como é que as pessoas normais se podem transformar em carrascos do seu semelhante. No final do calvário de Basini, já tinha mudado de campo, mas sem qualquer compaixão ou sentimento místico. A ideia dos números imaginários, em matemática, que o seu professor fora impotente para explicar, exortando-o a crer enquanto não pudesse ele mesmo compreender, ajuda-o a integrar a anomalia do mal na sociedade humana. Entretanto, Törless julga a vítima e os seus algozes com a distância dum entomologista.

Na parte mais contestável do filme, a intuição de Musil torna-se prelecção. Diante do reitor e do pessoal docente, visivelmente dispostos a “passar uma esponja” sobre a sua responsabilidade e a justiçar o único culpado (a vítima), porque todos os alunos acabaram por se juntar no ginásio à orgia torcionária de Beineberg e Reiting, Törless ( Mathieu Carrière, na altura uma grande esperança), dum modo displicente, lança o resultado das suas elucubrações como “pérolas a porcos”. Ele realmente quer afastar-se do colégio e prosseguir o seu solitário caminho, longe da infecção.

A ligação entre o problema dos números imaginários que, apesar da sua não existência podem entrar, por exemplo, nos cálculos de engenharia duma ponte, como se diz no filme, e esse outro que é o de parecer que não há pessoas nem boas nem más, pois tudo dependeria duma oportunidade, fica por esclarecer. A ligação é apenas formulada por Törless e justifica, nas suas próprias palavras, uma nova cautela.

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