domingo, 3 de abril de 2011

SABE O QUE ESTÁS A DIZER


Sócrates e Aspásia (Daumier)


“É óbvio que a ignorância socrática não é de modo nenhum uma atitude negativa. Representa, pelo contrário, um ideal muito original e positivo do conhecimento humano e da conduta humana. Aquilo a que podemos chamar de cepticismo socrático é apenas uma máscara, atrás da qual, Sócrates, seguindo o seu modo irónico habitual, esconde o seu ideal. O cepticismo de Sócrates destina-se a destruir os muitos e diversos modos de conhecimento que obscurecem e tornam ineficaz a única coisa importante: o auto-conhecimento do homem.”

“The myth of the state”   (Ernst Cassirer)




Ironia, mas também astúcia, porque Sócrates esconde o seu ideal por detrás dum cepticismo aparente.

Ele tinha a experiência suficiente para saber que as convicções de cada um estão normalmente amuralhadas e, logo que se mostra uma certeza no outro campo, ergue-se a ponte levadiça. Porque um homem que não defendesse, intuitivamente, as suas crenças seria ainda mais frágil do que  o “roseau pensant” de Pascal.

A táctica do “Cavalo de Tróia” é a melhor para encontrar a porta aberta e os escudos encostados à parede. Sócrates, primeiro, simula partilhar o ponto de vista do seu “oponente” e está mesmo disposto a emprestar toda a força aos argumentos dele, mas só para melhor fazer nascer as suas objecções dentro da “cidadela”.

O famoso “só sei que nada sei” é a mais bela gazua do pensamento, porque é uma declaração que se propõe começar do zero e convida a outra parte a fazer o mesmo.

Mas o conhecimento do homem sobre si próprio é precisamente aquilo que, em princípio, não se poderia partilhar… Pelo que talvez a verdadeira interpretação do oráculo seja a dum “sabe o que estás a dizer”.

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