No filme de Kôji
Wakamatsu, “United Red Army” (2007), podemos assistir à transformação dum grupo
de jovens radicais, chegados directamente das lutas estudantis dos anos 60, no
Japão, em carrascos de si próprios. No isolamento da sua base na montanha, como
num outro castelo de Silling sadiano, a preparação para o que chamam de “guerra
de extermínio” contra os EUA e o capitalismo, leva-os a uma intensa preparação
psicológica com o fim de cortar todas as pontes com o seu meio de origem
(perigosos, acima de tudo, são o desejo de viver e qualquer sensualidade), de
modo a que só o cumprimento da sua missão e uma morte gloriosa tenham sentido.
A ideologia da
crítica e da auto-crítica que, noutro
contexto, poderia ser útil na obtenção do máximo rendimento da organização (uma
espécie de controle e de auto-avaliação no seio do grupo) e que, de qualquer
modo, não se pode confundir com a tradição ascética, por tornar o juízo sobre
os outros um dever, na base clandestina, torna-se uma verdadeira máquina
assassina (dos 29 membros do partido, 14 foram executados pelos seus
companheiros – até o fim acusados de “derrotismo”). O processo começava pelas
pressões de uns sobre os outros para o aprofundamento da auto-crítica. Ao menos
os congressistas de Staline não eram ingénuos ao ponto de “fornecerem lenha
para se queimarem”. A auto-crítica ritual que revelava não só as potenciais defecções
como os que poderiam contestar o poder do chefe levava quase imediatamente ao
assassínio. O clima de intimidação psicológica era tal que mesmo os mais
audazes e com as melhores provas durante a revolta estudantil e no próprio
partido deram mostras duma paralisante cobardia diante do chefe, investido do
poder de exigir a crítica e a auto-crítica aos outros. Mori (Gô Jibiki), o chefe,
de resto, começara a sua “carreira” com uma deserção e tinha iniciado uma
ligação com Hiroko Nagata (Akie Namiki), a fúria que “extorquia” as confissões
às mulheres do grupo, e, sem dúvida para o fazer esquecer refugiara-se no mais
extremista dos discursos e na “língua de pau” revolucionária, o que lhe
granjeara o ascendente e um simulacro de força.
Depois de serem obrigados
a mudar de local e a se separarem, Mori e Nagata foram presos e um último
punhado resistiu durante dez dias, numa estância de férias, ao cerco da
polícia, sem nunca terem, porém, a coragem de libertar uma mulher que
mantiveram refém durante esse tempo.
Mori, arrependido das
suas atrocidades, suicidou-se na prisão, o que considerou a sua “primeira tentativa revolucionária para o
grande salto”. Poder-se-ia dizer que a morte esteve sempre ao seu alcance.
Mas, na verdade, estamos aqui a falar de “salvação”, que é o contrário da
morte. É esse aspecto religioso da luta revolucionária que, apesar dessa luta
parecer anacrónica no Japão, quarenta anos depois dos acontecimentos narrados
neste filme, a torna actual e universal.
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