(The Dance of Death by Vincent of Kasta) |
“Li
ainda na vossa carta, com muito gosto, os princípios das futuras felicidades.
Ninguém as deseja mais do que eu. A das finanças era bem necessária. E eu
conheci uma personagem, outrora cabeça desta regência, que as segurava com
infinita felicidade dentro de um gabinete. Cada ramo das finanças era expresso
numa folha com a sua moldura como um quadro. Noutro quadro havia o resultado de
todos, que correspondia ao compêndio do livro de razão. Assim, num momento e
falando com os amigos ficava a saber todos os interesses do erário. Este método
chama-se o esquema do dar e haver.”
(Luís António
Verney, carta de 25/12/1765)
Os livros de dupla
entrada já eram conhecidos no século XIII, mas o autor fala nisso como se ainda
fossem novidade, como se a confusão e a imprevisibilidade continuassem a ser a
norma. Mas, no fundo, eram as contas duma economia doméstica a um nível mais
ampliado e claramente expostas nos dois lados do balanço. Se não se conseguem
juntar as pontas no final do exercício, há, muito provavelmente, que cortar na
despesa. Tudo é simples e como deve ser, segundo a bíblica justiça. A cigarra
da fábula sabia sempre o que a esperava.
Mas o que é que
acontece quando dentro de qualquer gabinete, normalmente, do outro lado do Atlântico,
um jovem feiticeiro, de dentes afiados e uma pança nascente, com um toque da
sua varinha multiplica os números da coluna dos débitos, deixando a “cabeça desta regência” à razão de juros?
Ora, do caldeirão dos
ratings
pode sair qualquer mistela que sempre encontrará quem a compre e espalhe o caos
nas contas de qualquer economia. As finanças passam então a ser governadas pelo
pânico. Nesta conjuntura, a economia já não tem quaisquer princípios de “futuras
felicidades” e, para sobreviver, só pode prometer a desgraça e a estrita
obediência aos novos magos. Ai de quem levantar a voz ou fizer questão de qualquer
ponto numa discussão. Tudo isso se paga em juros.
No meio desta medieval
dança de S. Vito, destacam-se os donos do nosso pensamento doravante: os
economistas. Sobretudo aqueles que nos querem fazer crer que o remédio contra a
feitiçaria é o livro de razão.
0 comentários:
Enviar um comentário