terça-feira, 5 de abril de 2011

O FEITIÇO DO CRÉDITO





Dum momento para o outro, ficamos pobres, ou tomamos consciência de que vivíamos “acima dos nossos meios”. Mas não era necessário. Podia-se continuar a empurrar para o futuro um acerto de contas, que poderia ser muito diferente, para pior (uma guerra, por exemplo), ou para melhor (uma geração mais preparada, ou a descida do Espírito Santo sobre os nossos empresários estado-dependentes e homens de partido).

Ora, este tão dramático percalço deve-se a uma única causa: à opinião e aos fazedores de opinião.

Os bancos deixaram de ser credíveis depois da grande débâcle para que arrastaram os próprios estados. E os bancos vivem da opinião. Se ninguém acreditasse neles, iam todos à falência. Tudo isto tem muito pouco a ver com qualquer tipo de racionalidade económica. Está mais próximo da imaginação e da propaganda. Um banco falido pode manter-se à tona e até florescer, gastando muito para além dos seus meios: multiplicando os seus balcões e exibindo os seus mármores como qualquer capela florentina. Os dourados sugerem a riqueza e a estabilidade duma monarquia do Ancien Régime. Mas tudo isso passou a ser visto, agora, com os olhos desiludidos de quem já não sabe em que acreditar.

As agências de rating, ainda há pouco tempo mancomunadas com os gabirus da Golden Sachs e dos Lehman Brothers que soltaram os ventos da ruína, dos odres de Wall Street, apresentam-se agora como a única fonte  credível. Porque toda a gente espera que, depois de tanto pecarem, se queiram redimir, pelo menos durante um tempo (é a sua travessia do deserto com tenda climatizada e prémios alibabescos), através de diagnósticos “rigorosos” e implacáveis como o destino.

Todos os erros do governo e os da oposição passaram a ter consequências mais desastrosas do que antes, senão irremediáveis. E os partidos não sabem viver de outra maneira, senão de crise em crise. Isso parece depender menos das pessoas que os formam do que das escolhas que são obrigadas a fazer para salvar os partidos. Tempos difíceis para o clubismo democrático em que temos vivido.

Se não estamos todos doidos, devia ser possível convencer os credores de que têm todo o interesse em que possamos pagar a dívida ( o que implica juros razoáveis e responsabilização da Internacional especulativa), em vez de nos encurralarem para uma ruptura de consequências imprevisíveis, ou para uma solução à islandesa.

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