quarta-feira, 9 de março de 2011

TINTIN NA LUA




“No seu memorando de 1985, Yakovlev sugeria que um dos partidos se chamasse Partido Socialista e o outro Partido Democrático do Povo e que ambos fizessem parte de uma espécie de frente popular denominada União de Comunistas. (…) Mas a proposta, embora impraticável, era entendida como uma reforma política muito mais séria do que isso. Eleições, as quais Yakovlev tencionava que fossem genuinamente disputadas, deveriam ter lugar de 5 em 5 anos (…).

“The Gorbachev Factor”  (Archie Brown)




O principal conselheiro de Gorbachev recomendava, logo no início do mandato do Secretário-Geral, a divisão do partido, com eleições, introduzindo, assim, “um significativo elemento de pluralismo político.”

A resposta de Gorbachev foi oral. Sem se mostrar escandalizado, rejeitou a proposta de Yakovlev com a palavra “Rano” (cedo de mais). Brown diz que em 1990, o contexto político tinha mudado dramaticamente e “então, Gorbachev podia e quase certamente deveria ter corrido o risco de fragmentar o partido, cujas profundas divisões ideológicas, nos poucos anos precedentes, se tinham escancarado, em vez de forrar com papel as fissuras”.

Dizia-se há alguns anos que a Revolução era um comboio que passava e que dependia de nós tomá-lo a tempo ou perdê-lo, talvez para sempre. Mas geralmente as oportunidades “agarradas pelos cabelos” não correspondem a situações maduras e revelam-se oportunidades sim, mas para outra coisa diferente do que pensávamos.

Gorbachev raras vezes deixou de aproveitar as brechas que o sistema lhe foi abrindo. Perdeu, talvez, a oportunidade de 1990 e ficou sem iniciativa, como se viu. O “comboio” tinha-o levado para onde ele não queria. Por isso o Gorbachev post-URSS nos dá a ideia de Tintin desembarcado na Lua. O mundo terá ficado melhor, mas umas das figuras mais importantes do século ainda se encontra na antecâmara da História à espera de julgamento.

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