“A
política é a arte de impedir as pessoas de meterem o nariz em coisas que lhes
dizem realmente respeito.”
(Paul Valéry)
Às vezes não chega a
arte. Quando, por exemplo, a novidade apanha desprevenidos os que têm por
missão fazer a política, como aconteceu no dia 12 deste mês, com milhares e
milhares a quererem “meter o nariz”. Essas pessoas descobriram que tinham o poder
de se juntarem e de se apresentarem como uma força, como um rio temporariamente
desviado do seu curso para encher uma barragem simbólica.
É por isso muito
pedagógico observar como os partidos reagiram ao fenómeno da “multidão
instantânea” que deixa os grandes organizadores de massas com água na boca. Mas
enquanto que estes podem negociar com o poder a ameaça dos que querem “meter o
nariz”, os instantâneos ( e para já espontâneos) só podem dispersar de mãos
vazias e a “compreensão” de todos, inclusive dos que governam.
Parece, de facto, que
a “arte política” se justifica por um paradoxo: é que o poder é “sintético” e,
nas camadas superiores, solitário. E não só as ditaduras ou as oligarquias – e que
é a democracia, fora do período eleitoral, senão uma espécie de oligarquia simbolicamente
controlada? Aliás, a relação entre o acto de votar e aquilo que cada um faria,
a cada momento, se pudesse governar, é do género da que existe entre uma
fotografia do céu e a noite estrelada se pudéssemos dar uma volta pelo espaço.
O poder do “todos” é um símbolo e não pode ser outra coisa. Porque todos não
rima com governação.
O problema é que a
percepção do “homo democraticus”, se
ainda não se tornou cínico, é a de que o poder deve ser distribuído por todos,
como a água e a electricidade. Daí que a política se esforce por “gerir” essa
ilusão que consome a maior parte do tempo dos políticos. Porque os únicos que
realmente conseguem “meter o nariz” são os que tratam o poder como coisa sua
porque já ocupam os lugares.
0 comentários:
Enviar um comentário