terça-feira, 1 de março de 2011

O TASER





Por que é que aquelas imagens nos chocam? Não chocaram, ao que parece, o grupo de polícias que submeteu o Sr. Gouveia ( não um número, como seria noutro tempo e noutro lugar) a um ritual de castigo e humilhação, como resposta ao desafio do prisioneiro que se recusou a limpar a porcaria da sua própria cela. 

Podia dizer-se que aqui o problema é a desproporção entre a força e o aparato (com os uniformes e elmos saídos duma qualquer Guerra das Estrelas) da equipa encarregada de "persuadir" o preso a mudar de ideias, a chamá-lo à razão, e o patético homem nu que vemos sempre de costas, com aquela marca do "aneu logou" que é a tatuagem.

E este seria mais um caso anónimo de abuso do poder, em que a força, qualquer que ela seja, resvala tão naturalmente, não fosse o vídeo divulgado pelo "Público", catapultar uma cadeia em Paços de Ferreira, desconhecida da maior parte dos portugueses, para o ignominioso estatuto duma Abu Grhaib ou de outra Guantánamo.

Entramos numa época em que, graças, sobretudo, à tecnologia, são os cidadãos que agora dispōem de uma espécie de panóptico (a célebre invenção de Bentham, no século XIX) sobre o poder na sua forma pública.

Mas o espaço privado não pode deixar de sofrer o ricochete deste novo dispositivo (vítima da mesma injunção de todo o poder: a de ser usado só porque existe), com a sua instantânea ubiquidade e o seu "voyeurismo" que não é menos terrível do que o do público dos autos-da-fé nos tempos da Inquisição.

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