Lições de Kant |
“Decerto
não é difícil de perceber que o ‘Eu penso’ dará lugar a uma ilusão dialéctica,
uma vez que nunca poderemos pensar a nossa própria morte, e dado que nos
reencontramos sempre iguais a nós mesmos. Neste sentido, sentimo-nos eternos,
como dizia Spinoza. Eternos e não imortais, eis o ponto.”
“Lettres sur
Kant” (Alain)
Há uma idade para
isso, para nos sentirmos eternos. Se não podemos pensar a nossa própria morte e
os sinais da decadência ainda não são visíveis, quando, pelo contrário, pisamos
a terra como se a nossa força devesse durar como o sol e a lua, esse sentimento
é o mais natural.
É um paradoxo
aparente que, ao mesmo tempo, saibamos que a morte não vai esquecer-se de nós
(nem com a partida de xadrez imaginada por Bergman, no “Sétimo Selo”). Porque
há uma diferença entre saber, pelo que se passa ou passou com os outros, e
sentir que a vida em nós enfraquece.
Alain evoca a famosa
lição de Jules Lagneau, seu mestre: “não
se pode dizer que Deus existe, porque existir é depender das outras coisas; e
isso equivale a dizer que Deus não é uma coisa; que o espírito não é uma coisa”.
É assim que se deve
entender a eternidade. Somos mortais mas, num certo sentido, não podemos morrer.
E, segundo a Analítica de Kant, “o
espírito subsiste, todavia sem jamais aparecer. Tal é o ser quase inapreensível
do nómeno e o fundamento dum novo dogmatismo.” (ibidem)
Volto ao princípio.
Há um tempo para nos sentirmos eternos e um tempo para sentirmos que, pelo
contrário, a nossa existência é demasiado frágil, razão pela qual a verdade de
que (também) somos eternos tem muito pouca força.
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