domingo, 27 de maio de 2007

A DÚVIDA HIPERBÓLICA


O jovem Nietzsche

"Proclamar assim a fenomenalidade do mundo interior, é em primeiro lugar alinhar este último pelo mundo dito exterior (...); para compreender este ponto, é preciso ter presente no espírito o ataque contra o positivismo: ali onde este diz: só há factos, Nietszche diz: factos, é o que não há, o que há são interpretações. Estendendo a crítica à assim dita "experiência interna", Nietzsche arruína no princípio o carácter de excepção do Cogito em relação à dúvida que Descartes dirigia contra a distinção entre o mundo do sonho e o da vigília."

"Soi-même comme un autre" (Paul Ricoeur)


Ricoeur reconhece que Nietzsche tem razão para dizer que levou a dúvida ainda mais longe do que Descartes, sem lhe conceder, contudo, a desconstrução do sujeito.

E este espírito, que alguém já chamou da suspeita, não se ficou pela especulação metafísica ou teológica. Está no cerne da teoria popperiana do conhecimento científico, por exemplo.

O que a dúvida hiperbólica trouxe à consciência moderna não foi o fim do dogmatismo, mas, na esteira da revolução kantiana, o fim do nosso sono.

A aceitação de certos artigos dogmáticos tem, por isso, a mesma justificação que a recusa, por princípio, de todos os dogmas.

É o estatuto de verdade que em ambos os casos deixa de poder ser invocado.

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