Não há relação sexual. Frase lacaniana que parece ir contra a evidência. E se não há relação é porque o sexo não é do corpo. No entanto, o próprio exemplo do homem primitivo parece relegar a prática genital para a urologia.
Um vício de cultura leva-nos a sondar os rins do selvagem que está na nossa cabeça. Nada apoia essa ideia de que o homem para eliminar ou se desfazer de uma tensão precisa de ajuda. O instinto é um traço de união abstracto que deixa sempre em aberto a questão da origem do prazer. É legítimo, então, supor que o animal se limita a interpretar sinais, que os dois sexos são verdadeiros símbolos.
Que todos os portadores de falo de uma tribo das Novas Hébridas sejam solicitados a apagar no órgão da viúva a marca do antigo senhorio é o que me faz pensar irresistivelmente num sistema de escrita. O corpo do outro sexo resume tudo aquilo que se quer dizer. Metáfora essencial, nele se apresenta o objecto anterior à poesia e à diferença no espaço. O sujeito no instante dessa divisão dentro de si mesmo ganha consciência do outro como sexo, carácter escritural presente ou ausente. O instrumental trabalha a superfície com a mesma figura obsessiva. O encontro platónico é extra-territorial. Passa-se na região do não escrito e da liberdade. Mas no comum dos casos, o prazer é o que há de mais inexplicável e de mais obscuro. A relação, o que há de mais utópico. No meio de isto tudo a ordem aparece e o pensamento. Da tatuagem e da magia se chega à ideia moral mais abstracta.
O amor carnal é um caso da infância sempre viva em cada um. E é preciso como que uma metamorfose, ligada por muitos laços às trocas afectivas e às compensações do sentimento, no animal mitológico que devora o corpo dos amantes. Também se vê, por outro lado, como o homem se encontra como criança, e a mulher, como mãe, sempre. No sexo nada é o que parece.
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