Guido Piovene (1907/1974)
"'Não é necessário um choc revolucionário como na revolução francesa ou russa. Cada país tem uma rotura revolucionária diferente segundo a sua história, a sua realidade.' O senador Fortunati é um homem de cultura, e até o melhor cérebro do comunismo bolonhês. Pergunto-lhe se depois da rotura revolucionária, por ele perspectivada, a ciência e a arte permaneceriam livres. 'Libérrimas', responde,' com uma única restrição: a nova sociedade terá o direito de se defender contra as formas de arte que têm como substracto uma realidade económico-social superada'. Por exemplo? pergunto. Responde: 'A pornografia.' e aqui estamos de acordo. Depois, acrescenta: 'A evasão.' Ai de mim! abrem-se fúnebres perspectivas."
"Viaggio in Italia" ( Guido Piovene)
Piovene percorreu o seu país de 1953 a 1956 e deixou-nos no relato dessa viagem páginas cheias de observações curiosas como estas.
E a resposta do senador Fortunati não é assim tão anacrónica quanto isso, em relação ao que se passa ainda hoje em Portugal.
Continua-se a pensar em termos de causa e efeito as relações da arte e da ciência com a sociedade, como se tivessem a simplicidade da mecânica.
Claro que a influência da arte "não alinhada" (que Goebbels, por exemplo, discriminava como decadente) não parece, na inactualidade da "rotura revolucionária" uma prioridade da defesa. Mas é outra a ideia do senador. Ele acredita que tanto a arte quanto a ciência fazem parte da luta ideológica contra os inimigos de classe. É esta maneira de pensar que explica os impasses do academismo oficial na arte e as teorias estapafúrdias dum Lyssenko no campo da genética.
Mas aqui o argumento procura a maior base de apoio possível e por isso apela ao moralismo burguês, incluindo nas restrições a pornografia e a evasão (evidentemente a definir pelo ministério do interior).
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