sábado, 23 de maio de 2009

CONFISSÃO


"Confession" (1998-Aleksandr Sokurov)


"Confissão", de Aleksandr Sokurov, tem o condão de nos dar a espessura do tempo a bordo dum navio russo em viagem pelo Ártico.

O comandante narra a vida da tripulação, que se resume a muito pouca coisa: o espaço é exíguo, todos estão sob a vigilância uns dos outros e, como diz o narrador, a privacidade não tem nem pode ter aqui lugar. As cenas, como num documentário, mostram-nos os marinheiros a comer ou a dormir. Tirando isso, a actividade principal decorrente do problema do espaço é a limpeza.

A noite ártica (dez minutos de luz do dia apenas) agrava o pendor melancólico e fatalista da raça. O silêncio e a imobilidade opressivos dão a estes homens confinados por uma obrigação férrea o ar de estarem à espera, como numa situação terminal.

Perante as inspecções sanitárias que espiolham as suas partes íntimas, os recrutas despem-se uns a seguir aos outros sem um murmúrio ou um esgar de contrariedade. O narrador põe no espírito dum deles a revolta: - Por que é que eu tenho de aguentar isto? Por que é que estou aqui? Para a seguir concluir que, tendo apenas dezoito anos, não é ninguém neste mundo. Apesar da nudez dos corpos, o desejo não tem espaço, o homoerotismo parece gelado como as paredes de aço ou a paisagem cinzenta.

"O Norte não precisa de nós, nem nós queremos nada dele", desabafa consigo mesmo o comandante. A única vida humana ali são os autores do passado, como Tchekov, não a noite gelada e as extensões que se adivinham.

Quem conseguir vencer a prova da lentidão e da monotonia, tem neste filme um alimento de eleição, uma raridade no cinema de hoje.

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