quarta-feira, 4 de junho de 2008

FUGA PARA A FRENTE


Santo Antão


"O êxodo para o deserto foi o mais radical acto poético de que jamais se incumbiram os homens. Enquanto metáforas divinas vivas, os antigos monges retiraram-se para o elemento adverso ao homem, para descobrirem pelo seu próprio corpo, ou, muito mais, contra este, o que significa ser-em-fogo, ser-em-espírito, já-ser-ali."

"O Estranhamento do Mundo" (Peter Sloterdijk)


Os Padres do Deserto foram viver para o deserto do Egipto, a partir do século III, como anacoretas e cenobitas, procurando Deus no silêncio e longe do mundo.

Segundo Sloterdijk, foi a este preço que se cristianizaram as massas oriundas do paganismo. A pregação do Evangelho não era suficiente para criar a ideia duma alma separada e autónoma em relação ao corpo.

No deserto, o corpo saudável não encontra o seu sustento e os sentidos confundem-se com a alucinação.

É a alma que alimenta e triunfa sobre a natureza. O deserto foi uma reincarnação do dualismo platónico.

Experiências como essa têm uma descendência inesperada nas ideias mais abstractas.

Sloterdijk diz que esta fuga do mundo é anti-triâdica ( a tríade seria constituída por Deus, a Alma e o Mundo).

Nos nossos dias, não faz sentido perguntar pelo monge em nós, mas "Enquanto for inerente a todo o moderno um rasgo fundamental para a melhoria do mundo, a estrutura deste pode ser interpretada como uma generalizada fuga do mundo para a frente;" (ibidem)

0 comentários: