sexta-feira, 7 de outubro de 2011

O DISCURSO DO AMOR

Marcel Proust



"Charlus pega o queixo do narrador e deixa subir os dedos magnetizados até às suas orelhas, 'como os dedos de um barbeiro'." Barthes analisa o trecho de Proust: "O sentido (o destino) electriza a minha mão; vou romper o corpo opaco do outro, obrigá-lo (seja a responder, a retirar-se ou a que deixe fazer) a entrar no jogo do sentido: vou 'fazê-lo falar'. No campo amoroso não há 'acting-out'; nenhuma pulsão, talvez, inclusivamente, nenhum prazer, nada mais do que signos, uma actividade desprovida de fala; dispor, em cada ocasião furtiva, do sistema ( o paradigma) da pergunta e da resposta."


("Fragments d'un discours amoureux")




O amor como linguagem e compulsão da fala é, sem dúvida, tema eminente da literatura e Barthes emprega aqui explicitamente o termo de discurso. Não fala do corpo, senão negativamente ( as pulsões, o próprio prazer podem estar de todo ausentes ).

É provável que a "paixão amorosa", tenha uma origem exclusivamente literária ou relacionada com as várias formas de arte, com o seu código específico. Aquilo a que chamamos amor (seguido ou não da palavra romântico) é, de facto, romanesco ou, nos nossos tempos, "cinematográfico" (e "mediático").

Por isso, o "paradigma" da pergunta e da resposta, muito para lá das palavras, pode explicar a dialéctica amorosa e as paixões idealizantes.

Parece que ao amor, neste sentido, é indispensável uma imagem que não vem do indivíduo (ou só dele), mas da cultura.

Do gesto do barão de Charlus podíamos expurgar toda a sensualidade e atribuí-lo ao campo do poder e da conquista.

0 comentários: