"La Vénus Noire" (2010, Abdellatif Kechiche) |
O filme é rebarbativo nas suas
descrições. Insiste no circo fora do espectáculo. Mas fica uma parábola “barroca”
para nossa edificação: a história da exploração integral de um ser humano.
Tal como o animal de que tudo é
aproveitado, a sua energia enquanto vivo e a sua carne depois de morto, Sarah Baartman,
natural da África do Sul, nos últimos anos do império napoleónico, foi
exibida diante da populaça de Londres e de Paris e, tornada um fenómeno de
exotismo, mesmo para a alta sociedade que é aqui apresentada como mais selvagem na
sua decadência do que os próprios selvagens. Segundo o filme, a sua carreira terminou depois de falhar na
ocultação da sua inteligência e sensibilidade que não agradavam a quem procurava uma excitação fácil e sem culpa (mas, na verdade, porque o espectáculo não tinha condições para prosseguir no país ocupado, depois da queda do imperador). Sarah fica então reduzida à prostituição pura e dura e acaba por morrer devido a uma infecção. Por
fim, já como cadáver, o seu corpo é apropriado por naturalistas, como Cuvier, que no
interesse da ciência o desconjuntaram sem dó nem piedade.
A sua vulva, objecto duma inaudita
curiosidade (com o famoso "avental hotentote"), foi conservada em formol para um
segundo ciclo de exibição no anfiteatro das universidades e o seu traseiro em
gesso oferecido numa outra espécie de circo.
1 comentários:
É um dos paradoxos que vivo: sinto necessidade de conhecer o horror de que a nossa natureza humana é capaz, mas não não consigo "ver".
Pela mão de Mandela, Sarah Baartman regressou à sua terra.
Maria Helena
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