Elias Canetti (1905/1994) |
“Penso
que o ser humano individual se sente ameaçado pelos outros e experimenta por
esta razão alguma ansiedade em relação a ser tocado por qualquer coisa de
desconhecido, e que ele se procura proteger por todos os meios do desconhecido
criando distâncias à sua volta, esforçando-se por não entrar em contacto demasiado
próximo com os outros seres humanos. Todos os seres humanos experimentam isto,
que se tenta não empurrar os outros, e que não se gosta de ser empurrado pelos
outros. Apesar de todas as medidas preventivas, os seres humanos nunca perdem
completamente o medo de serem tocados. O que é notável é que este medo
desaparece completamente numa multidão. É um paradoxo realmente importante.”
Elias Canetti (Discussion with Theodor W. Adorno)
A explicação de
Canetti para este paradoxo é que todos sentimos um enorme alívio ao nos libertarmos
daquele medo imergindo numa multidão. E é, talvez, como o medo do frio, antes
de mergulharmos na água do mar.
O certo é que essa
imersão produz em nós um estado euforizante que, no caso das massas de gente,
se multiplica provocando uma tensão que precisa de encontrar um exutório, seja
ele o grito em uníssono ou o movimento caudaloso pelas ruas mais próximas.
A multidão, além
disso, ao fazer-nos esquecer o nosso sistema defensivo dá-nos uma sensação
enganosa de força extraordinária.
Canetti utiliza a
ideia de multidão invisível, de origem provavelmente religiosa, e cita o caso
de Richelin, um abade cisterciense da Idade Média que se sentia rodeado duma
poeira espessa de demónios, comparando esse medo e essa legião invisível com o
que sentimos em relação aos bacilos e a toda a espécie de vírus ou micróbios…
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