domingo, 26 de junho de 2011

VIAGEM À ÍNDIA



“A nossa fabulosa aventura foi sempre sem sujeito como os gregos já sabiam. Mas agora navegamos pela primeira vez e a sério no mar do nosso sublime, ou apenas trivial e universal, anonimato.”

“Eduardo Lourenço no prefácio a “Uma Viagem à Índia” de Gonçalo Tavares)


Os gregos sabiam que os deuses tramaram Édipo ( Ele tudo fez para evitar a tragédia, apenas para melhor cumprir a profecia). Isso não o “libertou” do seu destino, como o faria a psicanálise reconhecendo a origem do trauma.

Quando se acolhem  o contexto social e as circunstâncias psicológicas no tribunal, procede-se como se, de facto, não existisse sujeito e a condenação, nessa medida, fosse injusta. Bloom, a personagem da anti-epopeia de Gonçalo Tavares, “não está disposto a vazar os olhos por um pecado de que não é sujeito.” (ibidem)

Ora, se a nossa viagem à Índia não foi fruto da vontade de nenhum  herói, se foi uma “gesta colectiva” como a mitologia do Estado Novo a apresentou, o seu sujeito é Portugal.

Mas hoje, desfeita essa mitologia, pode dizer-se  que a viagem não teve sujeito ou que o perdeu. E não há deuses para nos tramarem. Ou, como diz Gonçalo Tavares,

“os deuses actuam
Como se não existissem,
E assim
Não existem, de facto, com extrema eficácia.”

Isto é, somos tramados à segunda potência.

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