quinta-feira, 23 de junho de 2011

A BORBULHA




“Ninguém é tão susceptível, nem mesmo uma mulher bonita que se levanta com uma borbulha no nariz, quanto um autor ameaçado de sobreviver à sua reputação.”


“Le neveu de Rameau” (Denis Diderot)


A consciência de que perdemos o talento ou de que uma borbulha se apresenta antes de nós pode causar mau humor a mais do que um Cyrano. Mas o herói de Rostand “pega o toiro pelos cornos” e faz uma glosa em vários tons do seu nariz. Nenhuma mulher bonita poderia fazer o mesmo sem se tornar pedante e sem renunciar à graça para sempre, porque uma beleza tão dependente da opinião não merece o nome que tem.

Ora, no cinema, a sobrevivência à reputação da beleza é uma questão de tempo, e eu não tenho conhecimento de actores ou actrizes a quem isso dê mau humor. Ou conheço casos extremos como o da Garbo que se recusou a lidar com o problema, exilando-se.

É que ao contrário da beleza que se alimenta da memória dos outros, essas estrelas brilham sempre no nosso ecrã, por isso as sobreviventes não envelhecem como nós. Têm o halo que nos impede de ver numa velha carcaça o final da história.

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