segunda-feira, 10 de novembro de 2008

OS CÂNTAROS


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Ó boca de fonte, doadora, ó boca

que inexaurível dizes uma só coisa, pura, -

tu, máscara de mármore ante a face

fluida da água. E no plano de fundo


a origem dos aquedutos. De longe, passando

junto aos túmulos, da vertente do Apenino

trazem-te a tua fala, que então

pelo negro envelhecer do queixo


passa e cai na concha em tua frente.

Esta é a orelha jacente e adormecida,

a orelha de mármore pra que falas sempre.


Uma orelha da Terra. Apenas pra si só

ela fala assim. Interpõe-se um cântaro,

parece-lhe que estás a interrompê-la.


Sonetos a Orfeu (Rainer Maria Rilke, tradução de Paulo Quintela)



A água como metáfora do dizer da Terra que um cântaro interrompe.

As palavras (sempre as mesmas?) brotam da eterna fonte para serem recebidas na concha de mármore.

Está assim tão longe da prosa dos nossos dias este poema?

O que fica do que dizemos uns aos outros senão o que os livros e outros cântaros transportam para o fluir mais lento da memória?

O passado inspira-nos assim contido nas suas paredes.

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