segunda-feira, 25 de agosto de 2008

TESTEMUNHOS SUPLICANTES


"O Regresso do Filho Pródigo" (Rembrandt)


"Aquele que encontra os quadros de que a sua experiência precisa sente-se forte. Existem vários, mesmo se não podem ser muito numerosos, porque a sua função significativa é a de manter concentrada uma realidade que, dispersa, voaria em estilhaços e desapareceria. É preciso também que não seja um quadro único, esse violenta aquele que o possui, não o deixa em paz e interdita-lhe toda a mudança. É de vários quadros de que cada homem tem necessidade para a sua própria vida. Quando, em boa hora, os encontra, não perde muitas coisas de si próprio."

"Le Flambeau dans l'Oreille" (Elias Canetti)


Canetti, referindo-se a seguir à "Parábola dos Cegos" de Breughel, diz que todos os cegos que viu depois descendem desse quadro.

E se é verdade que alguns quadros valem mais do que parábolas e reúnem diante de nós as cenas com mais significado e o modelo dos nossos sentimentos, parece muito improvável que a pintura dos nossos dias possa aspirar a tão nobre função.

Mas aqui é preciso reconhecer que a arte moderna já não encontra o tempo dessa inspiração e que, emparelhada com a revolução mediática, se dirige principalmente ao nível das "pequenas percepções" de que fala José Gil.

Ao olharmos para um quadro "antigo" como o "Regresso do Filho Pródigo" de Rembrandt, não é já o nosso mundo que podemos reconhecer. É um passado que só vive se quisermos expandir-nos na dimensão do tempo.

De certa maneira, estamos na situação dos bárbaros conquistadores cuja rudeza só pode salvar a piedade por esses testemunhos suplicantes.

0 comentários: