"(...) na sociedade comunista do futuro
'pacificamente se possível, senão violentamente', as paixões dos homens terão
rédea curta: porque 'todas são boas por natureza, e só teremos que evitar o seu
mau uso e os seus excessos', e eles só serão evitados pelo mútuo equilíbrio e
pelo harmónico desenvolvimento do organismo humano, porque, diz o Dr Beddoe, 'é só quando uma raça atinge o seu
máximo desenvolvimento que ela atinge o ponto mais alto da sua energia e do seu
vigor moral.' É essa também a opinião do grande naturalista Charles
Darwin."
"Le droit à la paresse" (Paul Lafargue)
O que é que não se pode sonhar quando julgamos ter
descoberto a lei de desenvolvimento das sociedades humanas, podendo esperar
que, fatalmente, com ou sem dores de parto, a História afastará de cena todos
os vilões, e todos os homens de "boa vontade" poderão viver num mundo
que lhes fará justiça, necessariamente?
O "direito à preguiça" é o regresso a uma imaginária sociedade colectora em que
as forças da Natureza trabalharão por nós e para nós, e em que, enfim, livres da "exploração do homem pelo
homem", todos poderão desenvolver as suas capacidades em benefício próprio
e da comunidade.
Ora, esta visão não anda longe dos círculos extáticos,
parapeitos dum espectáculo sublime, donde Deus é contemplado pelos anjos, no
Paraíso dantesco. É o fim do problemático, consequência do fim da própria
sociedade, em que todos os antagonismos foram superados, e do indivíduo se ter
revelado na sua exclusiva "boa natureza".
Faz bem revisitar estas "capelas" da Utopia,
como, na escadaria do Bom Jesus, em Braga, olhar as cenas da Via Sacra. É
a nossa Odisseia, e tal é, talvez, o pano de fundo de todas as nossas ideias
sobre a justiça.
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