quarta-feira, 7 de março de 2012

A VIA SACRA



"(...) na sociedade comunista do futuro 'pacificamente se possível, senão violentamente', as paixões dos homens terão rédea curta: porque 'todas são boas por natureza, e só teremos que evitar o seu mau uso e os seus excessos', e eles só serão evitados pelo mútuo equilíbrio e pelo harmónico desenvolvimento do organismo humano, porque, diz o  Dr Beddoe, 'é só quando uma raça atinge o seu máximo desenvolvimento que ela atinge o ponto mais alto da sua energia e do seu vigor moral.' É essa também a opinião do grande naturalista Charles Darwin."


"Le droit à la paresse" (Paul Lafargue)



O que é que não se pode sonhar quando julgamos ter descoberto a lei de desenvolvimento das sociedades humanas, podendo esperar que, fatalmente, com ou sem dores de parto, a História afastará de cena todos os vilões, e todos os homens de "boa vontade" poderão viver num mundo que lhes fará justiça, necessariamente?

O "direito à preguiça" é o regresso  a uma imaginária sociedade colectora em que as forças da Natureza trabalharão por nós e para nós, e em que, enfim,  livres da "exploração do homem pelo homem", todos poderão desenvolver as suas capacidades em benefício próprio e da comunidade.

Ora, esta visão não anda longe dos círculos extáticos, parapeitos dum espectáculo sublime, donde Deus é contemplado pelos anjos, no Paraíso dantesco. É o fim do problemático, consequência do fim da própria sociedade, em que todos os antagonismos foram superados, e do indivíduo se ter revelado na sua exclusiva "boa natureza".

Faz bem revisitar estas "capelas" da Utopia, como, na escadaria do Bom Jesus, em Braga, olhar as cenas da Via Sacra. É a nossa Odisseia, e tal é, talvez, o pano de fundo de todas as nossas ideias sobre a justiça.

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