"Oistros, o moscardo que atormenta os bois, é a
potência mais evasiva, e no entanto omnipresente, entre aquelas que governaram
os Gregos."
"Les noces de Cadmos et Harmonie" (Roberto
Calasso)
Que um insecto possa ter-se tornado um formidável
operador mitológico diz muito sobre o espírito anti-sistemático dos Gregos.
Não é só que a hierarquia, apesar de tudo existente,
entre os deuses do Olimpo careça da perfeição piramidal (os irmãos dividem o
poder entre si, sob a férula mais do que complacente de Zeus). O imponderável,
o ser mais ínfimo podem tanto servir o desígnio de uma divindade contra outra,
como confundir o próprio "pai dos deuses", que, com a melhor das
graças, reage como se reconhecesse uma justiça superior à sua.
A etapa histórica seguinte, com o monoteísmo, poria fim
às diferentes "comarcas" da Razão. As contradições deixaram de ser o
resultado de disputas entre iguais, mas o sintoma de um problema para resolver,
um defeito da lógica.
Uma ideia como a do Limbo ou a do Purgatório exprimem a
nova situação em que já nada escapa ao inventário.
Mas a história do moscardo que, por vingança de Hera,
perseguiu Io até ao Egipto, e que com isso mudou a face dos continentes, é hoje, tal
como ontem, um bom símbolo do que nem a razão nem o poder podem explicar.
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