quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

AS PERPLEXIDADES DE LEVIN

Tristan Pate as Levin, Elizabeth Twells as Anna

(Arcola Theater, London)

"Enquanto ouvia a discussão do seu irmão com o professor, notou que eles ligavam estas questões científicas a esses problemas espirituais, e que em certas alturas quase os afloravam; mas sempre que estavam muito perto do ponto que lhe parecia crucial, prontamente batiam em retirada e mergulhavam outra vez num mar de subtis distinções, reservas, citações, alusões e apelo para autoridades, de tal modo que lhe era difícil perceber de que estavam a falar."

"Anna Karenina" (Leão Tolstoi)



Levin conhecia o tema duma revista que lera. Interessava-se pelas questões científicas, com o diletantismo das classes ociosas, e porque parecia ser próprio dum homem com o seu estatuto e as suas ideias progressistas, estar informado dessas coisas.

Mas o que lhe interessava, realmente, eram aquelas ideias, velhas como a humanidade, sobre o significado da vida e da morte, quem somos e para onde vamos, etc. A sua atenção fora despertada para a hipótese da ciência estar de algum modo ligada a essas questões "existenciais", como se dizia, pejorativamente, nos meus tempos de militância ( não era senão a vontade de afirmar a importância da nossa "acção", comparada com as ideias confusas que permitiam aos outros alhear-se).

Se o irmão de Levin e o professor Sergey Ivanovitch rodeiam a questão, é porque, segundo o pensamento do escritor, a ciência, deliberadamente, a ilude. Desde que se separou da filosofia, fez um caminho solitário e cheio de êxitos retumbantes, mas, no seu orgulho, esqueceu-se de declarar o que levava de filosofia debaixo do capote.

A ciência moderna, depois de Tolstoi, já poucas dúvidas tem da existência, no seu âmago, dum "ponto cego", a questão crucial para Levin. O grande progresso é que, paradoxalmente, a ciência consegue  avançar tanto mais quanto mais estiver consciente disso.


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