sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

NOSTRA CULPA



“Estamos tão desesperados para encontrar uma maneira de controlar os terrores que nos cercam, que inventámos a culpa como pedra de toque das nossas explicações.”


“Evil in modern thought”  (Susan Neiman)



O homem primitivo, acossado pelos perigos da sua existência, não pensava. O alerta permanente não é pensamento. Pensar é um luxo da civilização, e só quando nos vemos privados das condições mínimas de segurança é que percebemos quanto a nossa mais nobre função depende da ordem social.

Além disso, todos experimentámos na infância o terror puro, que tal como o da espécie, nunca desaparece de todo. "Se isto é um homem" duvidava Primo Levi, falando do prisioneiro dos campos. É assim. A todo o momento podemos perder o pensamento, e a morte é só uma das máscaras do terror infantil.

Nestas condições, a ideia da culpa é uma escapatória. Permite-nos atribuir a nós mesmos os pequenos males e o desabar do mundo, o que nos dá a ilusão de controlarmos as coisas. Mais vale saber que sofremos porque caímos no desagrado dos deuses por causa dos nossos actos, do que não chegar a saber o que nos acontece.

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