sábado, 16 de outubro de 2010

PÃO E CIRCO




“(…) a democracia, como se diz, desaparece, não porque os notáveis despojaram o povo dela, mas porque a questão já não é escolher o homem que vai dirigir a cidade e quem, dos notáveis ou do povo, escolherá esse homem: a dificuldade é, muito antes disso, somente encontrar  um homem que se consiga levar a decidir-se a se imolar nesta ruinosa função.”

“Le Pain et le Cirque” (Paul Veyne)



É a consequência desse fenómeno tão pouco compreendido do ervegetismo que podíamos traduzir como qualquer coisa entre a beneficiência pública e o mecenato. Os ricos das épocas helenística e romana não o eram impunemente. Se não havia impostos directos, eram eles que suportavam muito do que hoje compete ao Estado. E os cargos, sendo mais honoríficos do que outra coisa, não eram remunerados, mas competia ao “investido” abrir liberalmente a bolsa, o que faziam, de resto, quase sempre voluntariamente por causa do prestígio e da “imortalidade” das epígrafes e dos pedestais que isso lhes trazia.

O domínio desta ordem de notáveis, baseado, sobretudo, na propriedade fundiária, não era posto em causa pelo povo enquanto fosse adulado pela riqueza, com “panem et circenses”, mas a consequência é que a democracia deixou de ter condições para se exercer quando o povo tão completa e voluntariamente se alheou da política.

0 comentários: