domingo, 4 de outubro de 2009

SOMOS TODOS INGÉNUOS



"Talvez o filósofo pense que uma Ética ou uma Monadologia são coisas mais sérias do que uma suite em menor? É verdade que certas questões que o espírito se coloca são mais gerais e mais naturais do que algumas produções da arte. Mas nada prova que essas questões não sejam ingénuas."

"Introduction à la méthode de Léonard de Vinci" (Paul Valéry)


Não é essa uma qualidade que podemos atribuir a toda a Antiguidade e a todo o empreendimento do espírito que caia sob a medida de um qualquer "progresso"?

Nesse sentido, Newton, por exemplo, era ingénuo visto que a sua teoria foi ultrapassada (além disso era crente antes da filosofia crítica e de Nietzsche, e dado à alquimia).

Mas trata-se aqui de explicar a ingenuidade da filosofia, sendo certo que nenhum progresso pode ser verificado de um sistema ou ideário filosófico para outro, não importa o tempo que medeie entre ambos. Ao contrário da ciência que tem um critério de demarcação (Popper) e é validada pelo sucesso (é verdadeira se funciona), a filosofia não pode ser "falsificada" pela experiência.

Isto é, só na medida em que abdicamos da verdade como algo de absoluto e assumimos a precariedade das teorias científicas é que podemos ser menos ingénuos em relação à ciência do que à filosofia.

Valéry advoga que esta, para escapar a essa desgraça, deve restringir-se "ao estado de produção particular ou de tendência individual de uma certa pessoa. E é o começo duma sabedoria ao mesmo tempo que o crepúsculo duma filosofia".

Vemos por isto que só nos livramos da ingenuidade reduzindo as nossas pretensões ao mínimo. A filosofia abatendo o seu voo até à altura da arte e a ciência ao da técnica, de um saber-fazer.

0 comentários: