"The informant" (2009-Steven Soderbergh) é um filme muito estimulante, em que nada parece o que é. Matt Damon é Mark Whitacre, um alto quadro duma grande empresa agro-alimentar que, movido pelo seu sentido cívico, resolve denunciar a prática de fixação de preços, em prejuízo dos consumidores, seguida pela multinacional. Mas ao mesmo tempo que se presta à espionagem para recolher as provas necessárias ao FBI, continua a beneficiar de avultadas "luvas" e às prerrogativas ligadas ao seu lugar e a fugir desavergonhadamente ao fisco.
Além disso, o nosso homem sente-se compelido a mentir a toda a gente não só sobre esses rendimentos como sobre a sua história familiar, para desespero dos seus amigos e dos seus advogados. Mas não escapa à prisão, mesmo se o Fisco, graças a ele, recuperou 500 milhões de dólares da multinacional.
A dupla personalidade é a ideia que logo nos ocorre para explicar este bizarro comportamento. Mas a personagem é tão natural e convincente que, por outro lado, nos parece demasiado familiar, e o filme ganha um alcance que vai muito para lá do caso psiquiátrico.
Porque a motivação cívica de Mark é sincera e os riscos que corre para a sua carreira e as pressões de toda a ordem são reais. Ele, porém, não vê a necessidade de mudar nada na sua vida, não sente qualquer "compulsão" para a coerência, para além de alimentar a esperança de substituir os "criminosos" na direcção da empresa. E é isso que o aproxima tanto de casos (nada psiquiátricos) que todos conhecemos. Por exemplo, o do moralista que gosta de arengar sobre os privilégios dos outros, tirando o seu suplemento de superioridade moral de alegados prejuízos sofridos por causa da sua "frontalidade" e honestidade, sem por isso tirar as consequências quanto ao seu próprio "status quo".
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