"Ora eu sei bem que nenhuma destas ideias vem de mim, porque tenho consciência da minha ignorância. Resta sem dúvida que as minhas orelhas as recolheram de outras fontes, donde eu me enchi como um vaso; mas tenho o espírito tão preguiçoso que já não me recordo como nem de quem as recebi."
"Phèdre" (Platão)
A proverbial modéstia socrática é, no fundo, uma ironia. Sócrates poderia ter dito, contra o discurso de Lísias reportado por Fedro, que aquela era muito simplesmente a sua opinião. Mas, como sabemos, o método da "parteira" não lhe permite ter opiniões, já que o que ele procura é a verdade por nascer que cada um traz dentro de si. Refugia-se então numa fonte desconhecida para rebater Lísias e, a seguir, no que o seu δαίμων particular lhe soprou ao ouvido ou na inspiração do lugar para fazer a palinódia da sua crítica.
Mas, pensando bem, poderíamos ver nas palavras citadas acima um exemplo da figura de "com a verdade me enganas". De facto, nós somos aquela espécie de vaso, embora não seja por preguiça que não sabemos identificar as fontes, porque há toda uma metamorfose inconsciente do que aprendemos.
Já alguém disse que o principal da sabedoria é saber o que dizemos. Mas as nossas palavras são o exemplo mesmo do que corre de fonte desconhecida.
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