sexta-feira, 25 de dezembro de 2009

ÁGORA


Ágora (2009-Alejandro Amenábar)

Amenábar conseguiu o feito de salvar do naufrágio esta grande produção. As personagens têm vida própria, mas ao mesmo tempo encontramos nelas a qualidade do símbolo, tantas são as ocasiões em que, através delas, podemos ler a história dos nossos dias.

Na luta pelo poder, em Alexandria, nos últimos anos do século IV AD, os cristãos, fortalecidos pelo apoio romano, não ficam, em fanatismo, nada atrás dos talibãs que destruíram os budas de Bamiyan. E dos seus heróis, por mais cruéis e sanguinários, a Igreja fará santos e mártires, como deve ser, porque (Freud dixit) na origem da cultura está sempre um crime.

Não me parece que o esforço de equidistância em relação às várias facções (pagãos, cristãos e judeus) peque por "politicamente correcto". Talvez que essa ideia de "objectividade" (sempre, mais ou menos, baldada) seja uma das nossas mais recentes conquistas, pois a verdade é que esquecemos durante mais de dois milénios a lição da "Ilíada" em que se fez justiça a Gregos e a Troianos.

O título deixa supor que a discussão pública é que determina os acontecimentos, mas a mensagem do filme é muito mais pessimista porque a massa em movimento não tem um leme seguro que a impeça de massacrar um grande espírito como Hypatia e nem de cometer o maior dos sacrilégios: a destruição do seu próprio passado.

2 comentários:

Anónimo disse...

O filme tem aspectos de interesse e também tem inverdades históricas graves. Hipatia nunca foi directora da biblioteca de Alexandria, nem esta foi destruída pelos "talibãs" cristãos: foi Júlio César quem meteu mãos à obra.
Hipatia morreu por volta dos 60 anos...
O último parágrafo é lúcido e, infelizmente, continua actualizado.

Maria Helena

José Ames disse...

Aparentemente, o filme baseia-se na versão do grande historiador Edward Gibbon em "Decline and Fall of the Roman Empire". A idade com que Hypatia terá sido assassinada foi aos 45 anos. Júlio César, segundo Plutarco, provocou acidentalmente o primeiro incêndio da Biblioteca.

(http://ehistory.osu.edu/world/articles/ArticleView.cfm?AID=9)