terça-feira, 8 de julho de 2008

DAMASCO NA ESCURIDÃO


Murasaki Shikibu


"Estimando, contudo, que o facto de contemplar sozinho estas flores avermelhadas equivaleria a vestir um traje de damasco na escuridão da noite, decidi compartilhar esta visão; mostre este ramo à sua senhora quando se apresentar uma ocasião favorável."

"O Romance do Genji" (Murasaki Shikibu)


A vaidade do Genji não nos surpreende porque é vista pelos olhos duma mulher que, ao longo do romance, não se cansa de enaltecer as qualidades femininas do príncipe.

Claro que temos presente um modelo sexual que não se pode aplicar à época Heian, no século X. Estes homens choram amiúde, adornam-se, empoam o rosto e borrifam "generosamente de perfume o cabelo e as roupas".

Toda esta feminilidade (segundo os nossos cânones) não impedia que os sexos tivessem, politicamente, papéis muito distintos, os homens detendo o poder e ocupando a cena pública e as mulheres confinadas a uma vida exclusivamente privada no seu "pavilhão da ala norte".

O machismo é inconcebível nesta cultura, em que os sexos, longe de aprofundarem as diferenças naturais, parecem não ter necessidade da dramática demarcação que nos caracterizou até há bem pouco tempo.

E, na falta de um critério suficientemente subtil para distinguir os géneros, sentimo-nos tentados a comparar a desigualdade política entre homens e mulheres à que existe entre as classes, com a sua "pré-história" de domínio e submissão.

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