Yukio Mishima
No filme de Paul Schrader "Mishima, a Life in Four Chapters" (1985), o corpo explode na escrita.
Enquanto o leitmotive da acção final que culmina os ensaios repetidos nas palavras vai cosendo os capítulos, vemos as histórias retiradas das obras do escritor, em que a morte está sempre presente no narcisismo das personagens, caminharem para a coda final.
Mishima gostava de se fazer representar como S. Sebastião, figura em que a beleza morre ao espelho, como o vira Derek Jarman , cerca de dez anos antes.
Numa das histórias, um homem, preocupado com a decadência física, passa a dedicar-se ao culturismo para alcançar a forma ideal. Escolhe depois morrer com uma mulher que, evidentemente, não ama, porque é apenas um espelho que lhe vai talhando no corpo, até à morte, pequenas incisões como as setas do santo.
Com o seppuku , a pena finalmente encontra a espada e Mishima rouba o corpo à decadência, num acto de escrita em que as palavras são imediata e irremediavelmente eficazes.
A arenga que antes de se suicidar dirige aos recrutas reunidos na parada, sem os apetrechos de amplificação que qualquer demagogo não deixaria de usar, sob o ruído ensurdecedor de um helicóptero - e a sua admissão de que nem sequer o ouviram vem dar mais força ao caso - justifica a imagem da opinião triunfante: a de que se trata de um louco vociferante a pedir um colete de forças.
Vou ter de voltar aos textos para salvar o verdadeiro Mishima. Em qualquer caso, cometeu o erro de pensar que qualquer acto, por mais trágico, pode salvar-se por si só do esquecimento.
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