"As filhas de Jethro" (Sandro Boticelli) |
"É poder do génio fazer-nos amar uma beleza que
sentimos mais real do que nós, naquelas coisas que aos olhos dos outros são tão
particulares e tão perecíveis quanto nós próprios."
Marcel Proust
O que é dizer o mesmo que a arte é o melhor meio de nos
compreendermos. Não, evidentemente, porque, em princípio, dura mais do que nós,
nem isso a tornaria mais real.
O platonismo de Proust descobre, por exemplo, na pintura,
a forma e os símbolos duma vida humana que, doutro modo, não seria salva da
perda do sentido, porque a arte é o nosso antídoto contra a entropia
universal...
O embeiçamento de Swann por Odette de Crécy, que lhe vem
do "reconhecimento" nela duma figura de Botticelli, corresponde à
percepção duma realidade maior que transcende a corrente da existência, e não é tão
extraordinário quanto parece.
De facto, na medida em que o amor chamado romântico não é
o desejo, encontraremos nele sempre um elemento idealista alimentado pela arte,
popular ou não.
A transfiguração de Odette, via Botticelli, é, assim, um
caso típico do amor e um triunfo, aparentemente anacrónico, de Platão. A ironia
disto é que o adjectivo platónico designaria um amor obsoleto...
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