"Heresia, derivada do Grego 'airesis': ir pelo seu
próprio caminho."
(Karen Armstrong, "The case for God")
O mais popular dos poemas de José Régio, "Cântico
Negro", professa, nesse sentido, a vontade herética. E não há
individualista que se preze que não diga que "não vai por aí".
A heresia tornou-se, numa cultura individualista como a
nossa, na própria 'doxa', na opinião dominante.
Mas este exemplo revela também o grau de descentralização
do poder a que chegámos. Não devemos restringir esse processo à organização
administrativa do Estado. De facto, já não precisamos todos de crer no mesmo
Deus, ou no mesmo ídolo, e a tutela da Igreja ou do Partido, em muitos lugares
da terra, é coisa do passado. Heresia ou dissidência são o mesmo sintoma dum
poder que não se arrisca a confiar na liberdade da consciência religiosa ou
cívica.
Mas, rigorosamente, não se trata de confiar nos
indivíduos. Trata-se de dispensar as suas decisões, porque se construiu um
sistema que assegura o funcionamento das coisas, ao mesmo tempo que transmite o
sentimento de que as decisões individuais é que contam.
Infelizmente, a homeostasia do sistema não nos evita as
crises que levam tantos à descrença. Assim, cada vez maior é o número dos que
ao lerem a inscrição à entrada que diz: "Que não entre quem não for economista.", escolhem o seu próprio caminho.
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